Sem tempo para parar e pensar
A única esperança é o próximo copo.
Se te apetecer, podes passear.
Sem tempo para parar e pensar,
A única esperança é o próximo copo.
É inútil hesitar no limite,
Pior que inútil é toda esta conversa.
A única esperança é o próximo copo.
Se te apetecer, podes passear.
Tradução de José Agostinho Baptista.
Malcom Lowry
Retirado do blog:
Insónia
sábado, agosto 18, 2007
Diário de Malcom Lowry

"Sou capaz de conceber um escritor de hoje, mesmo um
escritor intrinsecamente de primeira classe, que simplesmen-
te não consegue entender, que nunca foi capaz de entender, o
que seus companheiros escritores estão ou estiveram buscando
e que sempre foi tímido demais para perguntar.
Tal escritor sente essa deficiência em si mesmo até as raias da angústia.
Essencialmente um camarada modesto, a vida toda ele tentou
entender o mais que pôde (embora talvez não o suficiente),
e assim seu quarto está repleto de Partisan Reviews, Kenyon
Reviews, Minotaurs, revistas Poetry, Horizons, até mesmo ve-
lhos Dials, de cujo conteúdo ele não consegue extrair absolu-
tamente nada.."
in Malcom Lowry "Através do Panamá"
escritor intrinsecamente de primeira classe, que simplesmen-
te não consegue entender, que nunca foi capaz de entender, o
que seus companheiros escritores estão ou estiveram buscando
e que sempre foi tímido demais para perguntar.
Tal escritor sente essa deficiência em si mesmo até as raias da angústia.
Essencialmente um camarada modesto, a vida toda ele tentou
entender o mais que pôde (embora talvez não o suficiente),
e assim seu quarto está repleto de Partisan Reviews, Kenyon
Reviews, Minotaurs, revistas Poetry, Horizons, até mesmo ve-
lhos Dials, de cujo conteúdo ele não consegue extrair absolu-
tamente nada.."
in Malcom Lowry "Através do Panamá"
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literatura,
Malcom Lowry
sexta-feira, agosto 17, 2007
B de Beber (Gilles Deleuze)

Gilles Deleuze entrevistado por Claire Parnet
B de Beber
"Gilles Deleuze: Bebi muito, bebi muito. Parei, bebi muito... Seria preciso perguntar a outras pessoas que beberam, perguntar aos alcoólatras. Acho que beber é uma questão de quantidade, por isso não há equivalente com a comida. Há gulosos, há pessoas... comer sempre me desagradou, não é para mim, mas a bebida é uma questão... Entendo que não se bebe qualquer coisa. Quem bebe tem sua bebida favorita, mas é nesse âmbito que ele entende a quantidade. O que quer dizer questão de quantidade? Zomba-se muito dos drogados, ou dos alcoólatras, porque eles sempre dizem: "Eu controlo, paro de beber quando quiser". Zombam deles, porque não se entende o que querem dizer. Tenho lembranças bem claras. Eu via bem isso e acho que quem bebe compreende isso. Quando se bebe, se quer chegar ao último copo. Beber é, literalmente, fazer tudo para chegar ao último copo. É isso que interessa.
[...] Em outros termos, um alcoólatra é alguém que está sempre parando de beber, ou seja, está sempre no último copo. O que isto quer dizer? É um pouco como a fórmula de Péguy, que é tão bela: não é a última ninféia que repete a primeira, é a primeira ninféia que repete todas as outras e a última. Pois bem, o primeiro copo repete o último, é o último que conta.
O que quer dizer o último copo para um alcoólatra? Ele se levanta de manhã, se for um alcoólatra da manhã, há todos os gêneros, se for um alcoólatra da manhã, ele tende para o momento em que chegará ao último copo. Não é o primeiro , o segundo, o terceiro que o interessa, é muito mais, um alcoólatra é malandro, esperto. O último copo quer dizer o seguinte: ele avalia, há uma avaliação, ele avalia o que pode agüentar, sem desabar... Ele avalia. Varia para cada pessoa. Avalia, portanto, o último copo e todos os outros serão a sua maneira de passar, e de atingir esse último. E o que quer dizer o último? Quer dizer: ele não suporta beber mais naquele dia. É o último que lhe permitirá recomeçar no dia seguinte, porque, se ele for até o último que excede seu poder, é o último em seu poder, se ele vai além do último em seu poder para chegar ao último que excede seu poder, ele desmorona, e está acabado, vai para o hospital, ou tem de mudar de hábito, de agenciamento.
De modo que, quando ele diz: o último copo, não é o último, é o penúltimo, ele procura o penúltimo. Ele não procura o último copo, procura o penúltimo copo. Não o último, pois o último o poria fora de seu arranjo, e o penúltimo é o último antes do recomeço no dia seguinte. O alcoólatra é aquele que diz e não pára de dizer: vamos... é o que se ouve nos bares, é tão divertida a companhia de alcoólatras, a gente não se cansa de escutá-los, nos bares quem diz: é o último, e o último varia para cada um. E o último é o penúltimo.
[...] Não, ele não diz: amanhã eu paro; diz: paro hoje para recomeçar amanhã.
CP: Então, já que beber é sempre parar de beber, como se pára de beber totalmente, já que você parou?
GD: É muito perigoso, me parece que acontece rápido. Michaux disse tudo, os problemas de droga e os problemas de álcool não estão tão separados. Há um momento em que isso se torna perigoso demais, porque, aí também é uma crista, como quando eu dizia "a crista entre a linguagem e o silêncio", ou a linguagem e a animalidade, é uma crista, é um estreito desfiladeiro.
Tudo bem beber, se drogar, pode-se fazer tudo o que se quer, desde que isso não o impeça de trabalhar, se for um excitante é normal oferecer algo de seu corpo em sacrifício.
Beber, se drogar são atitudes bem sacrificais. Oferece-se o corpo em sacrifício. Por quê? Porque há algo forte demais, que não se poderia suportar sem o álcool. A questão não é suportar o álcool, é, talvez, o que se acredita ver, sentir, pensar, e isso faz com que, para poder suportar, para poder controlar o que se acredita ver, sentir, pensar, se precise de uma ajuda: álcool, droga, etc.
A fronteira é muito simples. Beber, se drogar, tudo isso parece tornar quase possível algo forte demais, mesmo se se deve pagar depois, sabe-se, mas em todo caso, está ligado a isto, trabalhar, trabalhar. E é evidente que quando tudo se inverte, e que beber impede de trabalhar, e a droga se torna uma maneira de não trabalhar, é o perigo absoluto, não tem mais interesse, e, ao mesmo tempo, percebe-se, cada vez mais, que quando se pensava que o álcool ou a droga eram necessários, eles não são necessários.
Talvez se deva passar por isso, para perceber que tudo o que se pensou fazer graças a eles podia-se fazer sem eles.
Admiro muito a maneira como Michaux diz: agora, tornou-se, tudo isso é... ele pára. Eu tenho menos mérito, porque parei de beber por razões de respiração, de saúde, etc., mas é evidente que se deve parar ou se privar disso. A única justificação possível é se isso ajuda o trabalho. Mesmo se se deve pagar fisicamente depois. Quanto mais se avança, mais a gente diz a si mesmo que não ajuda o trabalho...
[...]
GD: É algo forte demais na vida, não é algo terrificante, é algo forte demais, poderoso demais na vida. Acredita-se, de modo um pouco idiota, que beber vai colocá-lo no nível desse algo mais poderoso. Se pensar em toda a linhagem dos grandes americanos. De Fitzgerald a... um dos que mais admiro é Thomas Wolfe. É uma série de alcoólatras, ao mesmo tempo que é isso o que lhes permite, os ajuda, provavelmente, a perceber algo grande demais para eles.
[...] Claro, eles fizeram uma obra e o que foi o álcool para eles? Eles se arriscaram, arriscaram porque pensaram, com ou sem razão, que isso os ajudava. Eu tive a sensação de que isso me ajudava a fazer conceitos, é estranho, a fazer conceitos filosóficos. Ajudava, depois percebi que já não ajudava, que me punha em perigo, não tinha vontade de trabalhar se bebesse. Então se deve parar. É simples.
CP: É uma tradição americana, são poucos os escritores franceses que confessaram sua queda pelo álcool. Além disso, há algo que faz parte da escrita...
GD: Os escritores franceses não têm a mesma visão de escrita. Não sei se fui tão marcado pelos americanos, é uma questão de visão, de vidências, aqui considera-se que a filosofia, a escrita, é uma questão... De maneira modesta, ver algo, que os outros não vêem, não é esta a concepção francesa da literatura, mas note, houve também muitos alcoólatras na França.
CP: Mas eles param de escrever, na França. Têm muita dificuldade, os que conhecemos. Poucos filósofos confessaram sua queda pela bebida.
GD: Verlaine morava na rua Nollet, aqui ao lado.
CP: Exceto Rimbaud e Verlaine.
GD: Aperta o coração, pois quando pego a rua Nollet, digo: era este o percurso de Verlaine para ir beber seu absinto. Parece que morou em um apartamento horrível."
Gilles Deleuze entrevistado por Claire Parnet
B de Beber
"Gilles Deleuze: Bebi muito, bebi muito. Parei, bebi muito... Seria preciso perguntar a outras pessoas que beberam, perguntar aos alcoólatras. Acho que beber é uma questão de quantidade, por isso não há equivalente com a comida. Há gulosos, há pessoas... comer sempre me desagradou, não é para mim, mas a bebida é uma questão... Entendo que não se bebe qualquer coisa. Quem bebe tem sua bebida favorita, mas é nesse âmbito que ele entende a quantidade. O que quer dizer questão de quantidade? Zomba-se muito dos drogados, ou dos alcoólatras, porque eles sempre dizem: "Eu controlo, paro de beber quando quiser". Zombam deles, porque não se entende o que querem dizer. Tenho lembranças bem claras. Eu via bem isso e acho que quem bebe compreende isso. Quando se bebe, se quer chegar ao último copo. Beber é, literalmente, fazer tudo para chegar ao último copo. É isso que interessa.
[...] Em outros termos, um alcoólatra é alguém que está sempre parando de beber, ou seja, está sempre no último copo. O que isto quer dizer? É um pouco como a fórmula de Péguy, que é tão bela: não é a última ninféia que repete a primeira, é a primeira ninféia que repete todas as outras e a última. Pois bem, o primeiro copo repete o último, é o último que conta.
O que quer dizer o último copo para um alcoólatra? Ele se levanta de manhã, se for um alcoólatra da manhã, há todos os gêneros, se for um alcoólatra da manhã, ele tende para o momento em que chegará ao último copo. Não é o primeiro , o segundo, o terceiro que o interessa, é muito mais, um alcoólatra é malandro, esperto. O último copo quer dizer o seguinte: ele avalia, há uma avaliação, ele avalia o que pode agüentar, sem desabar... Ele avalia. Varia para cada pessoa. Avalia, portanto, o último copo e todos os outros serão a sua maneira de passar, e de atingir esse último. E o que quer dizer o último? Quer dizer: ele não suporta beber mais naquele dia. É o último que lhe permitirá recomeçar no dia seguinte, porque, se ele for até o último que excede seu poder, é o último em seu poder, se ele vai além do último em seu poder para chegar ao último que excede seu poder, ele desmorona, e está acabado, vai para o hospital, ou tem de mudar de hábito, de agenciamento.
De modo que, quando ele diz: o último copo, não é o último, é o penúltimo, ele procura o penúltimo. Ele não procura o último copo, procura o penúltimo copo. Não o último, pois o último o poria fora de seu arranjo, e o penúltimo é o último antes do recomeço no dia seguinte. O alcoólatra é aquele que diz e não pára de dizer: vamos... é o que se ouve nos bares, é tão divertida a companhia de alcoólatras, a gente não se cansa de escutá-los, nos bares quem diz: é o último, e o último varia para cada um. E o último é o penúltimo.
[...] Não, ele não diz: amanhã eu paro; diz: paro hoje para recomeçar amanhã.
CP: Então, já que beber é sempre parar de beber, como se pára de beber totalmente, já que você parou?
GD: É muito perigoso, me parece que acontece rápido. Michaux disse tudo, os problemas de droga e os problemas de álcool não estão tão separados. Há um momento em que isso se torna perigoso demais, porque, aí também é uma crista, como quando eu dizia "a crista entre a linguagem e o silêncio", ou a linguagem e a animalidade, é uma crista, é um estreito desfiladeiro.
Tudo bem beber, se drogar, pode-se fazer tudo o que se quer, desde que isso não o impeça de trabalhar, se for um excitante é normal oferecer algo de seu corpo em sacrifício.
Beber, se drogar são atitudes bem sacrificais. Oferece-se o corpo em sacrifício. Por quê? Porque há algo forte demais, que não se poderia suportar sem o álcool. A questão não é suportar o álcool, é, talvez, o que se acredita ver, sentir, pensar, e isso faz com que, para poder suportar, para poder controlar o que se acredita ver, sentir, pensar, se precise de uma ajuda: álcool, droga, etc.
A fronteira é muito simples. Beber, se drogar, tudo isso parece tornar quase possível algo forte demais, mesmo se se deve pagar depois, sabe-se, mas em todo caso, está ligado a isto, trabalhar, trabalhar. E é evidente que quando tudo se inverte, e que beber impede de trabalhar, e a droga se torna uma maneira de não trabalhar, é o perigo absoluto, não tem mais interesse, e, ao mesmo tempo, percebe-se, cada vez mais, que quando se pensava que o álcool ou a droga eram necessários, eles não são necessários.
Talvez se deva passar por isso, para perceber que tudo o que se pensou fazer graças a eles podia-se fazer sem eles.
Admiro muito a maneira como Michaux diz: agora, tornou-se, tudo isso é... ele pára. Eu tenho menos mérito, porque parei de beber por razões de respiração, de saúde, etc., mas é evidente que se deve parar ou se privar disso. A única justificação possível é se isso ajuda o trabalho. Mesmo se se deve pagar fisicamente depois. Quanto mais se avança, mais a gente diz a si mesmo que não ajuda o trabalho...
[...]
GD: É algo forte demais na vida, não é algo terrificante, é algo forte demais, poderoso demais na vida. Acredita-se, de modo um pouco idiota, que beber vai colocá-lo no nível desse algo mais poderoso. Se pensar em toda a linhagem dos grandes americanos. De Fitzgerald a... um dos que mais admiro é Thomas Wolfe. É uma série de alcoólatras, ao mesmo tempo que é isso o que lhes permite, os ajuda, provavelmente, a perceber algo grande demais para eles.
[...] Claro, eles fizeram uma obra e o que foi o álcool para eles? Eles se arriscaram, arriscaram porque pensaram, com ou sem razão, que isso os ajudava. Eu tive a sensação de que isso me ajudava a fazer conceitos, é estranho, a fazer conceitos filosóficos. Ajudava, depois percebi que já não ajudava, que me punha em perigo, não tinha vontade de trabalhar se bebesse. Então se deve parar. É simples.
CP: É uma tradição americana, são poucos os escritores franceses que confessaram sua queda pelo álcool. Além disso, há algo que faz parte da escrita...
GD: Os escritores franceses não têm a mesma visão de escrita. Não sei se fui tão marcado pelos americanos, é uma questão de visão, de vidências, aqui considera-se que a filosofia, a escrita, é uma questão... De maneira modesta, ver algo, que os outros não vêem, não é esta a concepção francesa da literatura, mas note, houve também muitos alcoólatras na França.
CP: Mas eles param de escrever, na França. Têm muita dificuldade, os que conhecemos. Poucos filósofos confessaram sua queda pela bebida.
GD: Verlaine morava na rua Nollet, aqui ao lado.
CP: Exceto Rimbaud e Verlaine.
GD: Aperta o coração, pois quando pego a rua Nollet, digo: era este o percurso de Verlaine para ir beber seu absinto. Parece que morou em um apartamento horrível."
Gilles Deleuze entrevistado por Claire Parnet
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sexta-feira, agosto 10, 2007
El Alcohol - Marguerite Duras

"He vivido sola con el alcohol durante veranos enteros, en Neauphle. [...]
En general, los obsesos sexuales no son alcohólicos. Los alcohólicos, incluso «a nivel de vertedero», son unos intelectuales. El proletariado, que ahora es una clase más intelectual que la clase burguesa, de muy lejos, tiene una propensión al alcohol, en el mundo entero. El trabajo manual es sin duda de todas las ocupaciones del hombre la que le lleva más directamente hacia la reflexión, es decir hacia la bebida. Ved la historia de las ideas. El alcohol hace hablar. Es la espiritualidad hasta la demencia de la lógica, es la razón que intenta comprender hasta la locura por qué esta sociedad, por qué este Reino de la Injusticia... y que siempre concluye con una
misma desesperación. Un borracho es a veces grosero, pero raramente obsceno. Algunas veces se encoleriza y mata. Cuando se ha bebido demasiado, se vuelve al principio del ciclo infernal de la vida. Se habla de felicidad, se dice que es imposible, pero se sabe lo que quiere decir la palabra.
Carecemos de un dios. Este vacío que se descubre un día en la adolescencia nada puede hacer que jamás haya tenido lugar. El alcohol ha sido hecho para soportar el vacío del Universo, el mecimiento de los planetas, su rotación imperturbable en el espacio, su silenciosa indiferencia en el lugar de vuestro dolor. El hombre que bebe es un hombre interplanetario. Se mueve en un espacio interplanetario. Es allí donde permanece al acecho. El alcohol nos consuela, no amuebla los espacios psicológicos del individuo, sólo sustituye la carencia de Dios. No consuela al hombre. Produce lo contrario, el alcohol conforta al hombre en su locura, lo transporta a las regiones soberanas donde es dueño de su destino. Ningún ser humano, ninguna mujer, ningún poema, ninguna música, ninguna literatura ni ninguna pintura puede sustituir esta función del alcohol en el hombre, la ilusión de la creación capital. Está ahí para remplazarla. Y lo hace en toda una parte del mundo que habría debido creer en Dios y que ya no cree en él. El alcohol es estéril. Las palabras del hombre dichas en la noche de la borrachera se desvanecen con ella tan pronto como llega el día. La borrachera no crea nada, no va con las palabras, ofusca la inteligencia, la sosiega. He hablado bajo los efectos del alcohol. La ilusión es total: lo que uno dice, nadie lo ha dicho aún. Pero el alcohol no crea nada que permanezca. Es el viento. Como las palabras. He escrito bajo los efectos del alcohol, tenía una facultad para dominar la borrachera, que me venía sin duda del horror por la borrachera. Jamás bebía para estar borracha. Jamás bebía deprisa. Bebía todo el tiempo y nunca estaba borracha. Estaba retirada del mundo, inalcanzable, pero no borracha.
[...]
Un cuerpo alcohólico funciona como una central, como un conjunto de compartimentos
diferentes vinculados entre sí por la persona entera. El primer afectado es el cerebro. Es el pensamiento. La felicidad por el pensamiento primero y luego el cuerpo. Es ganado, empapado poco a poco, y transportado-, es la palabra: transportado. A partir de cierto tiempo se tiene la elección. Beber hasta la insensibilidad y la pérdida de la identidad, o permanecer en las primicias de la felicidad. Morir de algún modo cada día, o bien seguir huyendo.
[La vida material, traducción de Menene Gras Balaguer para Plaza &
Janés]
http://www.tijeretazos.net/Literaria/MDuras/MDuras013.htm
En general, los obsesos sexuales no son alcohólicos. Los alcohólicos, incluso «a nivel de vertedero», son unos intelectuales. El proletariado, que ahora es una clase más intelectual que la clase burguesa, de muy lejos, tiene una propensión al alcohol, en el mundo entero. El trabajo manual es sin duda de todas las ocupaciones del hombre la que le lleva más directamente hacia la reflexión, es decir hacia la bebida. Ved la historia de las ideas. El alcohol hace hablar. Es la espiritualidad hasta la demencia de la lógica, es la razón que intenta comprender hasta la locura por qué esta sociedad, por qué este Reino de la Injusticia... y que siempre concluye con una
misma desesperación. Un borracho es a veces grosero, pero raramente obsceno. Algunas veces se encoleriza y mata. Cuando se ha bebido demasiado, se vuelve al principio del ciclo infernal de la vida. Se habla de felicidad, se dice que es imposible, pero se sabe lo que quiere decir la palabra.
Carecemos de un dios. Este vacío que se descubre un día en la adolescencia nada puede hacer que jamás haya tenido lugar. El alcohol ha sido hecho para soportar el vacío del Universo, el mecimiento de los planetas, su rotación imperturbable en el espacio, su silenciosa indiferencia en el lugar de vuestro dolor. El hombre que bebe es un hombre interplanetario. Se mueve en un espacio interplanetario. Es allí donde permanece al acecho. El alcohol nos consuela, no amuebla los espacios psicológicos del individuo, sólo sustituye la carencia de Dios. No consuela al hombre. Produce lo contrario, el alcohol conforta al hombre en su locura, lo transporta a las regiones soberanas donde es dueño de su destino. Ningún ser humano, ninguna mujer, ningún poema, ninguna música, ninguna literatura ni ninguna pintura puede sustituir esta función del alcohol en el hombre, la ilusión de la creación capital. Está ahí para remplazarla. Y lo hace en toda una parte del mundo que habría debido creer en Dios y que ya no cree en él. El alcohol es estéril. Las palabras del hombre dichas en la noche de la borrachera se desvanecen con ella tan pronto como llega el día. La borrachera no crea nada, no va con las palabras, ofusca la inteligencia, la sosiega. He hablado bajo los efectos del alcohol. La ilusión es total: lo que uno dice, nadie lo ha dicho aún. Pero el alcohol no crea nada que permanezca. Es el viento. Como las palabras. He escrito bajo los efectos del alcohol, tenía una facultad para dominar la borrachera, que me venía sin duda del horror por la borrachera. Jamás bebía para estar borracha. Jamás bebía deprisa. Bebía todo el tiempo y nunca estaba borracha. Estaba retirada del mundo, inalcanzable, pero no borracha.
[...]
Un cuerpo alcohólico funciona como una central, como un conjunto de compartimentos
diferentes vinculados entre sí por la persona entera. El primer afectado es el cerebro. Es el pensamiento. La felicidad por el pensamiento primero y luego el cuerpo. Es ganado, empapado poco a poco, y transportado-, es la palabra: transportado. A partir de cierto tiempo se tiene la elección. Beber hasta la insensibilidad y la pérdida de la identidad, o permanecer en las primicias de la felicidad. Morir de algún modo cada día, o bien seguir huyendo.
[La vida material, traducción de Menene Gras Balaguer para Plaza &
Janés]
http://www.tijeretazos.net/Literaria/MDuras/MDuras013.htm
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quarta-feira, agosto 01, 2007
Charles Baudelaire, "O Spleen de Paris"
"Devemos andar sempre bêbados. Tudo se resume nisto: é a única solução. Para não sentires o tremendo fardo do Tempo que te despedaça os ombros e te verga para a terra, deves embriagar-te sem cessar. Mas com quê? Com vinho, com poesia ou com virtude, a teu gosto. Mas embriaga-te. E se alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas duma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunta-lhes que horas são:
«São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com virtude, a teu gosto.»
Charles Baudelaire, "O Spleen de Paris"
«São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com virtude, a teu gosto.»
Charles Baudelaire, "O Spleen de Paris"
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Spleen de Paris
terça-feira, outubro 31, 2006
Alfabeto

Alfabeto
Estava eu no frio da morte a aproximar-se, quando pela derradeira vez me pus a fitar os seres, profundamente.
Ante o contacto mortal deste olhar de gelo, tudo o que não era essencial desapareceu. Entretanto eu ia-os perscrutando, querendo reter deles algo que nem o Morto pusesse largar. Eles adelgaçaram-se e acabaram por ficar reduzidos a uma espécie de alfabeto, mas um alfabeto capaz de servir no outro mundo, em qualquer mundo.
Aliviei-me assim do medo de me subtraírem o universo inteiro onde eu tinha vivido. Fortalecido com tal presa, contemplava-o invencido, e regressando o sangue, com a satisfação, às minhas arteríolas e veias, lentamente voltei a subir a vertente aberta da existência.
Henri Michaux, O retiro pelo risco Lisboa Fenda, pp. 34-35
Estava eu no frio da morte a aproximar-se, quando pela derradeira vez me pus a fitar os seres, profundamente.
Ante o contacto mortal deste olhar de gelo, tudo o que não era essencial desapareceu. Entretanto eu ia-os perscrutando, querendo reter deles algo que nem o Morto pusesse largar. Eles adelgaçaram-se e acabaram por ficar reduzidos a uma espécie de alfabeto, mas um alfabeto capaz de servir no outro mundo, em qualquer mundo.
Aliviei-me assim do medo de me subtraírem o universo inteiro onde eu tinha vivido. Fortalecido com tal presa, contemplava-o invencido, e regressando o sangue, com a satisfação, às minhas arteríolas e veias, lentamente voltei a subir a vertente aberta da existência.
Henri Michaux, O retiro pelo risco Lisboa Fenda, pp. 34-35
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segunda-feira, outubro 09, 2006
A um Deus desconhecido
A um Deus desconhecido
"O vento sussurrou um momento na relva e depois cresceu, trazendo consigo intensos odores a erva e a terra molhada, e a grande árvore agitou-se vivamente sob o vento. Joseph ergueu a cabeça e olhou para os seus enrugados ramos. Os olhos iluminaram-se-lhe em reconhecimento e desejou as boas vindas ao ser forte e simples que era seu pai, que pairara, com a sua juventude, como uma nuvem de paz, penetrando na árvore.
Ergueu a mão numa saudação. Disse baixinho: "Estou contente por ter vindo. Não me tinha apercebido até agora das saudades que sentia de si". A árvore mexeu-se ligeiramente. "Como vê é uma boa terra", continuou Joseph em voz baixa. "Vai gostar de cá estar". Abanou a cabeça para sacudir um resto de tontura, riu-se, em parte pelos seus pensamentos felizes, e em parte maravilhado com o seu súbito sentimento de irmandade para com a árvore... Pôs-se em pé, encaminhou-se para a velha árvore e beijou-lhe a casca"
John Steinbeck
A um Deus desconhecido
in http://soprarpalavrasaovento.blogspot.com/2006/10/um-deus-desconhecido.html
"O vento sussurrou um momento na relva e depois cresceu, trazendo consigo intensos odores a erva e a terra molhada, e a grande árvore agitou-se vivamente sob o vento. Joseph ergueu a cabeça e olhou para os seus enrugados ramos. Os olhos iluminaram-se-lhe em reconhecimento e desejou as boas vindas ao ser forte e simples que era seu pai, que pairara, com a sua juventude, como uma nuvem de paz, penetrando na árvore.
Ergueu a mão numa saudação. Disse baixinho: "Estou contente por ter vindo. Não me tinha apercebido até agora das saudades que sentia de si". A árvore mexeu-se ligeiramente. "Como vê é uma boa terra", continuou Joseph em voz baixa. "Vai gostar de cá estar". Abanou a cabeça para sacudir um resto de tontura, riu-se, em parte pelos seus pensamentos felizes, e em parte maravilhado com o seu súbito sentimento de irmandade para com a árvore... Pôs-se em pé, encaminhou-se para a velha árvore e beijou-lhe a casca"
John Steinbeck
A um Deus desconhecido
in http://soprarpalavrasaovento.blogspot.com/2006/10/um-deus-desconhecido.html
quinta-feira, agosto 24, 2006
sexta-feira, junho 23, 2006
quinta-feira, maio 25, 2006
terça-feira, maio 23, 2006
A linguagem com signos (sem serem linguísticos) ultrapassa em muito o ser humano, o símio-homem.
A linguagem com signos (sem serem linguísticos) ultrapassa em muito o ser humano, o símio-homem.
No entanto, gosto da ideia de Benveniste baseada na observação da dança das abelhas. Ou seja, a linguagem dos signos linguísticos é a única que (in)felizmente inclui o discurso indirecto. Daí sempre o seu carácter de tradução do passado e futuro (nunca do presente que já aconteceu). Algo de fora de nós que tende a reificar, a criar abstracções que podem ser tão cruéis como as armas.
Ver este texto sobre a dança das abelhas:
"As abelhas, segundo o experimento de Karl von Frisch, possuem um meio complexo para transmitir a mensagem: a distância e direção de localização do alimento, mas só executam os seus bailados para esse fim. Dizem que há comida, néctar ou pólen, para lá ou para cá, mas fora isso não articulam mais nada. Não há resposta e nem simbolização; a apreensão da mensagem é concreta. Vista a dança transmissora da mensagem por uma abelha, é necessário que essa vá até o alimento para informar a uma nova abelha o local onde ele se encontra. Não há memória da mensagem, a retenção leva a uma ação, à execução de um ato e se esgota aí. A capacidade abstrata do símbolo, ou seja, estar no lugar de outra coisa, representá-la na sua ausência, trazer e construir o pensamento para o outro: essas são propriedades humanas".
No entanto, gosto da ideia de Benveniste baseada na observação da dança das abelhas. Ou seja, a linguagem dos signos linguísticos é a única que (in)felizmente inclui o discurso indirecto. Daí sempre o seu carácter de tradução do passado e futuro (nunca do presente que já aconteceu). Algo de fora de nós que tende a reificar, a criar abstracções que podem ser tão cruéis como as armas.
Ver este texto sobre a dança das abelhas:
"As abelhas, segundo o experimento de Karl von Frisch, possuem um meio complexo para transmitir a mensagem: a distância e direção de localização do alimento, mas só executam os seus bailados para esse fim. Dizem que há comida, néctar ou pólen, para lá ou para cá, mas fora isso não articulam mais nada. Não há resposta e nem simbolização; a apreensão da mensagem é concreta. Vista a dança transmissora da mensagem por uma abelha, é necessário que essa vá até o alimento para informar a uma nova abelha o local onde ele se encontra. Não há memória da mensagem, a retenção leva a uma ação, à execução de um ato e se esgota aí. A capacidade abstrata do símbolo, ou seja, estar no lugar de outra coisa, representá-la na sua ausência, trazer e construir o pensamento para o outro: essas são propriedades humanas".
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segunda-feira, outubro 17, 2005
Nascemos com um traço de amor em nossos corações...
Nascemos com um traço de amor em nossos corações
"Nascemos com um traço de amor em nossos corações, que se desenvolve na medida em que o espírito se aperfeiçoa e que nos leva a amar o que nos parece belo sem que jamais nos tenha dito o que é. Além disso, o amor e a razão não são opostos porque o amor e a razão não são mais que a mesma coisa. Quanto maior o espírito, maiores as paixões."
Blaise Pascal
"Nascemos com um traço de amor em nossos corações, que se desenvolve na medida em que o espírito se aperfeiçoa e que nos leva a amar o que nos parece belo sem que jamais nos tenha dito o que é. Além disso, o amor e a razão não são opostos porque o amor e a razão não são mais que a mesma coisa. Quanto maior o espírito, maiores as paixões."
Blaise Pascal
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