quinta-feira, fevereiro 28, 2008

Galáxia nº 75
http://s132.photobucket.com/albums/q40/hanshino/galaxies/?action=view&current=galaxy75.jpg

"He, whose happiness is within, whose contentment is within, whose light is all within, that yogui, being one with Brahman, attains eternal freedom in divine consciousness".

Bhagavad - Gita


quinta-feira, fevereiro 21, 2008

e assim nasceu. e falava. assiduamente.
era como o verão. que se abrira. recente.
como um clarão rubro de inocência. bebia
então taças tecidas de espanto. o
exílio.
iniciara-se. como uma teia. tecida lentamente. por
estranha e eterna aranha.
quando parido. por um período de vida.
fecundo. a mãe
linda. morrera ao pari-lo. que
eternidade vazia e vã. como a de
um deus. mítico ou não. que interessa isso.
para a posteridade.

Manoel Cardôzo
lxª18.07.2003

terça-feira, fevereiro 05, 2008

Fail

"Muitas vezes eu desisti sem mesmo tentar"



My body doesn't move out or move back. Never.

The body (my body) stays in, it stays on in - unmoving.

Nothing else ever.
There's never been anything else.

I've never tried anything else, never failed at anything else.

But it doesn't matter really.

And I'll try again, I'll fail again.
Always

I'll fail better than I did before.
Always...
.........

Inspirado na citação de Samuel Beckett
"Ever tried. Ever failed. No matter. Try again. Fail again. Fail better".
Ver aqui:
http://samuel-beckett.net/w_ho.htm

sábado, fevereiro 02, 2008

Nunca percas um segundo na tua vida a tentar mudar o que é imutável. Nunca exageres até ao ponto de perder uma vida para querer mudar um segundo naquilo que é imutável. Aceita-te.

Aceita.
"Devemos andar sempre bêbados. Tudo se resume nisto: é a única solução. Para não sentires o tremendo fardo do Tempo que te despedaça os ombros e te verga para a terra, deves embriagar-te sem cessar. Mas com quê? Com vinho, com poesia ou com virtude, a teu gosto. Mas embriaga-te. E se alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas duma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunta-lhes que horas são: «São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com virtude, a teu gosto.»

Charles Baudelaire, Spleen de Paris, Relógio d’Água, Lisboa, 1991, p. 105

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

Eu vazio ou cheio?

Eu não sabia o que fazer nem o que dizer e eis que apelei ao amor-próprio. Eis que apelei à nossa infeliz condição humana baseada numa procura do preencher deste vazio impreenchível.

segunda-feira, janeiro 21, 2008

Laços

Laços - Toranja

Andamos em voltas rectas Na mesma esfera, Onde ao menos nos vemos Porque o fumo passou. A chuva no chão revela, Os olhos por trás. Há que levar o que restou E o que o tempo queimou. Tens fios de mais a prender-te as cordas, Mas podes vir amanha, Acreditar no mesmo Deus Tens riscos demais, A estragar-te o quadro. Se queres vir amanha, Acreditar no mesmo Deus Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços.. Andamos em voltas rectas Na mesma esfera Mas podes vir amanhã Se queres vir amanhã Podes vir amanhã Tens riscos de mais A estragar-me a pedra Mas se vieres sem corpo À procura de luz Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços, meu amor! Meu amor Meu amor...

Toranja

Ver aqui: http://www.youtube.com/watch?v=zIfKivOzpYw


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"Andamos em voltas rectas Na mesma esfera"

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Estamos sempre, sempre na mesma, mesmíssima esfera com a ilusão real de contacto, em voltas rectas . Muitas vezes acontece que essa ilusão parece concretizar-se.
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"Onde ao menos nos vemos Porque o fumo passou".

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Acontece e deve ser justamente tratado como um "acontecimento". Deve ser celebrado, com cuidado para não riscar. Não partir. Sem euforias. Como ponto de partida. Mudança.

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"Tens riscos de mais A estragar-me a pedra Mas se vieres sem corpo À procura de luz".


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Com esse "acontecimento" de luz e energia, a esfera parece, parece abrir-se. Sem corpo porque com o autêntico corpo. Procurando a luz. Sempre.


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"A chuva no chão revela, Os olhos por trás. Há que levar o que restou E o que o tempo queimou".


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Os olhos que olham, olham com intensidade até chorarem. E finalmente verem. Depois pouco resta, e esse pouco basta. É imenso.

quarta-feira, janeiro 16, 2008

E uma vontade de rir nasce do fundo do ser

"E uma vontade de rir nasce do fundo do ser. E uma vontade de ir, correr o mundo e partir, a vida é sempre a perder"

http://www.youtube.com/watch?v=9AvUeoH81ZI


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Uma vontade de rir da nostalgia do ser. Ela, essa vontade que vem das tripas, é o único antídoto para a tristeza. E a vontade de ir é uma força imensa que nos arrasta...


Uma vontade de quem nada tem a perder senão a sua não vida.

segunda-feira, janeiro 14, 2008

Caminhos

"Qualquer caminho é apenas um caminho e não constitui insulto algum - para si mesmo ou para os outros - abandoná-lo quando assim ordena o seu coração. (...) Olhe cada caminho com cuidado e atenção. Tente-o tantas vezes quantas julgar necessárias...

Então, faça a si mesmo e apenas a si mesmo uma pergunta: possui esse caminho um coração? Em caso afirmativo, o caminho é bom. Caso contrário, esse caminho não possui importância alguma."


C. Castaneda

terça-feira, janeiro 08, 2008

Sexo e amor

Continuando o debate do log anterior, encontrei um resumo de um livro do sociólogo italiano Francisco Alberoni, "Sexo e amor".

Talvez a vida actual seja complicada e fonte de muito sofrimento. Contudo emergem novas possibilidades, novas formas de ser mais ricas e abertas. Como em todos os partos, há fases dolorosas mas também novas vidas mais plenas e livres emergem.

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"Francesco Alberoni tem um novo livro editado em Portugal. Chamou-lhe "Sexo e Amor". A obra, que surge quase 30 anos após a publicação de "Enamoramento e amor", foi escrita como "uma consequência natural" dos estudos que sobre a matéria dos relacionamentos humanos Alberoni tem vindo a produzir.

"Sexo e Amor" marca um novo ponto de viragem , dando, pela primeira vez, uma ordem e um sentido à trama de aspectos divergentes e convergentes que relacionam o amor e o sexo.

"Pensei que valeria a pena estudar as várias sociedades, as várias combinações entre sexo e sociedade. Fiz vários retratos, a partir de centenas de entrevistas, e com eles tentei transmitir aquilo que os homens e as mulheres de hoje sentem, desejam, querem, repudiam".

Para Francesco Alberoni, "é muito difícil, senão impossível", que uma relação baseada só em sexo possa durar. "Na sociedade actual, em que o acesso à Internet está cada vez mais facilitado, o sexo ficou, por isso mesmo, mais vulgarizado", conclui. Alberoni também adianta que "é muito frequente que sejam as raparigas a terem mais cedo relações sexuais do que os rapazes. E isto acaba por lhes trazer grandes desilusões, porque afinal a um desejo muito intenso não corresponde uma grande satisfação sexual. O amor está em permanente conflito com o sexo. Ao contrário do que acontecia há um século, nos dias de hoje há cada vez mais uma tendência para chegar ao amor através do sexo. A pornografia, que a Internet tornou mais acessível aos mais jovens, favorece muito a sexualidade promíscua e a bissexualidade. Tudo isto funciona como um obstáculo ao que chamo o enamoramento. Porque este passa necessariamente por diversas fases. Passa pelo fascínio, pela interpretação, pelas provas de reciprocidade. Por isso é que cada vez mais difícil formar-se um casal. Transformar o enamoramento em amor é muito complicado. Há formas de paixão que têm todas as características de enamoramento mas que, no fim de contas, têm também mecanismos de autodestruição".

Para Francesco Alberoni, "o amor hoje em dia só acontece se houver uma extraordinária intimidade física e espiritual. Quem ama e não é amado sofre muito". O autor de "Sexo e Amor" defende também a ideia de que há de facto diferenças entre a sexualidade feminina e masculina. "Este é, aliás, o único domínio em que há diferenças. As mulheres são mais sensíveis aos odores, ao tacto. Uma mulher apaixonada pode ter um orgasmo só pelo facto de tocar um dedo da mão do homem que ama. No homem, pelo contrário, todas as sensações estão mais concentradas no pénis " .

Na obra agora editada pela Bertrand, Francesco Alberoni recorre a uma combinação de histórias verídicas e relatos na primeira pessoa, colhidos de entrevistas ou de obras literárias. A partir desta estrutura narrativa o sociólogo analisa as diferentes experiências amorosas subsequentes de cada uma das formas que o amor e o sexo podem tomar. O livro é um sucesso editorial em Itália onde em três meses vendeu mais de 30 mil exemplares".

Ana Vitória in JN de 15-11-2006

terça-feira, dezembro 18, 2007

Disseram-me hoje, assim, ao ver-me triste...

Disseram-me hoje, assim, ao ver-me triste...



"Disseram-me hoje, assim, ao ver-me triste:
"Parece Sexta-Feira de Paixão.
Sempre a cismar, cismar de olhos no chão,
Sempre a pensar na dor que não existe...

O que é que tem?! Tão nova e sempre triste!
Faça por estar contente! Pois então?!..."
Quando se sofre, o que se diz é vão...
Meu coração, tudo, calado, ouviste...

Os meus males ninguém mos adivinha...
A minha Dor não fala, anda sozinha...
Dissesse ela o que sente! Ai quem me dera!...


Os males de Anto toda a gente os sabe!
Os meus ...ninguém... A minha Dor não cabe
Em cem milhões de versos que eu fizera!...

Florbela Espanca


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Uma dor que não cabe em cem milhões de versos.

Nenhuma palavra exprime a dor. Nenhuma.

Não cabe dentro da palavra. Nunca coube. Por isso, aquele que escreve é também um construtor de metáforas sempre pobres perante este oceano que é a vida. As palavras são frágeis linhas que se lançam na imensidão da dor, da nossa dor original. Palavras que nos orientam no caos.



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Há uma força telúrica em Florbela Espanca. Algo que chega a assustar alguns. Talvez haja, nesta força da natureza, uma voz que vem do fundo. A nossa voz esquecida. Um olhar anterior. Primordial. Uma voz que, no nosso dia-a-dia feito de pequenos consumos e pequenas vidinhas, acaba por desaparecer em muitos de nós... Infelizmente.

domingo, dezembro 16, 2007

Boa Sorte / Good Luck

Há letras e músicas que nos superam.

Letras que são poemas extraordinários, licões de vida que nos acompanham como autênticos amigos. Total e incondicionalmente disponíveis.

É o caso da letra da canção "Boa sorte" de Vanessa da Mata e Ben Harper.

Para além das duas vozes que criam uma dobra dentro de nós, a letra descreve o fim de uma relação amorosa de uma forma pouco usual. É como se houvesse uma aceitação do fim porque é o começo de algo novo. A arte de recomeçar sempre. Depois de tomada uma decisão, desde que ela venha de dentro sem ser filtrada pelo nosso egozinho, deve-se ir em frente. A nossa vida é feita de milhares de decisões. Nunca devemos deixar que esse poder nos seja retirado. Nunca. Mesmo que a queda na noite nos assuste, nada há a temer quando essa paz interior nos invade. Uma paz que talvez jamais nos deixará...

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Boa Sorte / Good Luck

Vanessa Da Mata e Ben Harper

Composição: Vanessa da Mata


É só isso
Não tem mais jeito
Acabou, boa sorte
Não tenho o que dizer São só palavras
E o que eu sinto
Não mudará

Tudo o que quer me dar
É demais
É pesado
Não há paz
Tudo o que quer de mim
Irreais Expectativas Desleais

That's it
There's no way
It's over, Good luck
I have nothing else to say
It’s only words
And what l feel
Won’t change

Tudo o que quer me dar / Everything you want to give me
É demais / It's too much
É pesado / It’s heavy
Não há paz / There is no peace
Tudo o que quer de mim / All you want from me
Irreais / Isn’t real Expectativas / That expectations
Desleais

Mesmo se segure
Quero que se cure
Dessa pessoa
Que o aconselha
Há um desencontro
Veja por esse ponto
Há tantas pessoas especiais

Now even if you hold yourself
I want you to get cured
From this person
Who advises you
There is a disconnection
See through this point of view
There are so many special people in the world
So many special people in the world in the world

All you want All you want
Tudo o que quer me dar / Everything you want to give me
É demais / It's too much
É pesado / It's heavy
Não há paz / There's no peace
Tudo o que quer de mim / All you want from me
Irreais / isn’t real Expectativas / That expectations
Desleais

Now we're falling, falling, falling , falling into the night, into the night
Falling, falling, falling, falling into the night,into the night
Now we're falling, falling, falling , falling into the night, into the night
Falling, falling, falling, falling into the night


Ver aqui:

http://pt.netlog.com/go/out/url=-aHR0cDovL3d3dy55b3V0dWJlLmNvbS93YXRjaD92PWxSS01SZ2VhZzVn

sábado, agosto 18, 2007

Sem tempo para parar e pensar

Sem tempo para parar e pensar

A única esperança é o próximo copo.
Se te apetecer, podes passear.
Sem tempo para parar e pensar,
A única esperança é o próximo copo.
É inútil hesitar no limite,
Pior que inútil é toda esta conversa.
A única esperança é o próximo copo.
Se te apetecer, podes passear.

Tradução de José Agostinho Baptista.

Malcom Lowry


Retirado do blog:

Insónia

Diário de Malcom Lowry




"Sou capaz de conceber um escritor de hoje, mesmo um
escritor intrinsecamente de primeira classe, que simplesmen-
te não consegue entender, que nunca foi capaz de entender, o
que seus companheiros escritores estão ou estiveram buscando
e que sempre foi tímido demais para perguntar.

Tal escritor sente essa deficiência em si mesmo até as raias da angústia.

Essencialmente um camarada modesto, a vida toda ele tentou
entender o mais que pôde (embora talvez não o suficiente),
e assim seu quarto está repleto de Partisan Reviews, Kenyon
Reviews, Minotaurs, revistas Poetry, Horizons, até mesmo ve-
lhos Dials, de cujo conteúdo ele não consegue extrair absolu-
tamente nada.."

in Malcom Lowry "Através do Panamá"

sexta-feira, agosto 17, 2007

B de Beber (Gilles Deleuze)

Gilles Deleuze (1925-1995)


Gilles Deleuze entrevistado por Claire Parnet


B de Beber

"Gilles Deleuze: Bebi muito, bebi muito. Parei, bebi muito... Seria preciso perguntar a outras pessoas que beberam, perguntar aos alcoólatras. Acho que beber é uma questão de quantidade, por isso não há equivalente com a comida. Há gulosos, há pessoas... comer sempre me desagradou, não é para mim, mas a bebida é uma questão... Entendo que não se bebe qualquer coisa. Quem bebe tem sua bebida favorita, mas é nesse âmbito que ele entende a quantidade. O que quer dizer questão de quantidade? Zomba-se muito dos drogados, ou dos alcoólatras, porque eles sempre dizem: "Eu controlo, paro de beber quando quiser". Zombam deles, porque não se entende o que querem dizer. Tenho lembranças bem claras. Eu via bem isso e acho que quem bebe compreende isso. Quando se bebe, se quer chegar ao último copo. Beber é, literalmente, fazer tudo para chegar ao último copo. É isso que interessa.

[...] Em outros termos, um alcoólatra é alguém que está sempre parando de beber, ou seja, está sempre no último copo. O que isto quer dizer? É um pouco como a fórmula de Péguy, que é tão bela: não é a última ninféia que repete a primeira, é a primeira ninféia que repete todas as outras e a última. Pois bem, o primeiro copo repete o último, é o último que conta.

O que quer dizer o último copo para um alcoólatra? Ele se levanta de manhã, se for um alcoólatra da manhã, há todos os gêneros, se for um alcoólatra da manhã, ele tende para o momento em que chegará ao último copo. Não é o primeiro , o segundo, o terceiro que o interessa, é muito mais, um alcoólatra é malandro, esperto. O último copo quer dizer o seguinte: ele avalia, há uma avaliação, ele avalia o que pode agüentar, sem desabar... Ele avalia. Varia para cada pessoa. Avalia, portanto, o último copo e todos os outros serão a sua maneira de passar, e de atingir esse último. E o que quer dizer o último? Quer dizer: ele não suporta beber mais naquele dia. É o último que lhe permitirá recomeçar no dia seguinte, porque, se ele for até o último que excede seu poder, é o último em seu poder, se ele vai além do último em seu poder para chegar ao último que excede seu poder, ele desmorona, e está acabado, vai para o hospital, ou tem de mudar de hábito, de agenciamento.

De modo que, quando ele diz: o último copo, não é o último, é o penúltimo, ele procura o penúltimo. Ele não procura o último copo, procura o penúltimo copo. Não o último, pois o último o poria fora de seu arranjo, e o penúltimo é o último antes do recomeço no dia seguinte. O alcoólatra é aquele que diz e não pára de dizer: vamos... é o que se ouve nos bares, é tão divertida a companhia de alcoólatras, a gente não se cansa de escutá-los, nos bares quem diz: é o último, e o último varia para cada um. E o último é o penúltimo.
[...] Não, ele não diz: amanhã eu paro; diz: paro hoje para recomeçar amanhã.

CP: Então, já que beber é sempre parar de beber, como se pára de beber totalmente, já que você parou?

GD: É muito perigoso, me parece que acontece rápido. Michaux disse tudo, os problemas de droga e os problemas de álcool não estão tão separados. Há um momento em que isso se torna perigoso demais, porque, aí também é uma crista, como quando eu dizia "a crista entre a linguagem e o silêncio", ou a linguagem e a animalidade, é uma crista, é um estreito desfiladeiro.

Tudo bem beber, se drogar, pode-se fazer tudo o que se quer, desde que isso não o impeça de trabalhar, se for um excitante é normal oferecer algo de seu corpo em sacrifício.

Beber, se drogar são atitudes bem sacrificais. Oferece-se o corpo em sacrifício. Por quê? Porque há algo forte demais, que não se poderia suportar sem o álcool. A questão não é suportar o álcool, é, talvez, o que se acredita ver, sentir, pensar, e isso faz com que, para poder suportar, para poder controlar o que se acredita ver, sentir, pensar, se precise de uma ajuda: álcool, droga, etc.

A fronteira é muito simples. Beber, se drogar, tudo isso parece tornar quase possível algo forte demais, mesmo se se deve pagar depois, sabe-se, mas em todo caso, está ligado a isto, trabalhar, trabalhar. E é evidente que quando tudo se inverte, e que beber impede de trabalhar, e a droga se torna uma maneira de não trabalhar, é o perigo absoluto, não tem mais interesse, e, ao mesmo tempo, percebe-se, cada vez mais, que quando se pensava que o álcool ou a droga eram necessários, eles não são necessários.

Talvez se deva passar por isso, para perceber que tudo o que se pensou fazer graças a eles podia-se fazer sem eles.

Admiro muito a maneira como Michaux diz: agora, tornou-se, tudo isso é... ele pára. Eu tenho menos mérito, porque parei de beber por razões de respiração, de saúde, etc., mas é evidente que se deve parar ou se privar disso. A única justificação possível é se isso ajuda o trabalho. Mesmo se se deve pagar fisicamente depois. Quanto mais se avança, mais a gente diz a si mesmo que não ajuda o trabalho...

[...]

GD: É algo forte demais na vida, não é algo terrificante, é algo forte demais, poderoso demais na vida. Acredita-se, de modo um pouco idiota, que beber vai colocá-lo no nível desse algo mais poderoso. Se pensar em toda a linhagem dos grandes americanos. De Fitzgerald a... um dos que mais admiro é Thomas Wolfe. É uma série de alcoólatras, ao mesmo tempo que é isso o que lhes permite, os ajuda, provavelmente, a perceber algo grande demais para eles.

[...] Claro, eles fizeram uma obra e o que foi o álcool para eles? Eles se arriscaram, arriscaram porque pensaram, com ou sem razão, que isso os ajudava. Eu tive a sensação de que isso me ajudava a fazer conceitos, é estranho, a fazer conceitos filosóficos. Ajudava, depois percebi que já não ajudava, que me punha em perigo, não tinha vontade de trabalhar se bebesse. Então se deve parar. É simples.

CP: É uma tradição americana, são poucos os escritores franceses que confessaram sua queda pelo álcool. Além disso, há algo que faz parte da escrita...

GD: Os escritores franceses não têm a mesma visão de escrita. Não sei se fui tão marcado pelos americanos, é uma questão de visão, de vidências, aqui considera-se que a filosofia, a escrita, é uma questão... De maneira modesta, ver algo, que os outros não vêem, não é esta a concepção francesa da literatura, mas note, houve também muitos alcoólatras na França.

CP: Mas eles param de escrever, na França. Têm muita dificuldade, os que conhecemos. Poucos filósofos confessaram sua queda pela bebida.

GD: Verlaine morava na rua Nollet, aqui ao lado.

CP: Exceto Rimbaud e Verlaine.

GD: Aperta o coração, pois quando pego a rua Nollet, digo: era este o percurso de Verlaine para ir beber seu absinto. Parece que morou em um apartamento horrível."

Gilles Deleuze entrevistado por Claire Parnet

sexta-feira, agosto 10, 2007

El Alcohol - Marguerite Duras






"He vivido sola con el alcohol durante veranos enteros, en Neauphle. [...]

En general, los obsesos sexuales no son alcohólicos. Los alcohólicos, incluso «a nivel de vertedero», son unos intelectuales. El proletariado, que ahora es una clase más intelectual que la clase burguesa, de muy lejos, tiene una propensión al alcohol, en el mundo entero. El trabajo manual es sin duda de todas las ocupaciones del hombre la que le lleva más directamente hacia la reflexión, es decir hacia la bebida. Ved la historia de las ideas. El alcohol hace hablar. Es la espiritualidad hasta la demencia de la lógica, es la razón que intenta comprender hasta la locura por qué esta sociedad, por qué este Reino de la Injusticia... y que siempre concluye con una
misma desesperación. Un borracho es a veces grosero, pero raramente obsceno. Algunas veces se encoleriza y mata. Cuando se ha bebido demasiado, se vuelve al principio del ciclo infernal de la vida. Se habla de felicidad, se dice que es imposible, pero se sabe lo que quiere decir la palabra.

Carecemos de un dios. Este vacío que se descubre un día en la adolescencia nada puede hacer que jamás haya tenido lugar. El alcohol ha sido hecho para soportar el vacío del Universo, el mecimiento de los planetas, su rotación imperturbable en el espacio, su silenciosa indiferencia en el lugar de vuestro dolor. El hombre que bebe es un hombre interplanetario. Se mueve en un espacio interplanetario. Es allí donde permanece al acecho. El alcohol nos consuela, no amuebla los espacios psicológicos del individuo, sólo sustituye la carencia de Dios. No consuela al hombre. Produce lo contrario, el alcohol conforta al hombre en su locura, lo transporta a las regiones soberanas donde es dueño de su destino. Ningún ser humano, ninguna mujer, ningún poema, ninguna música, ninguna literatura ni ninguna pintura puede sustituir esta función del alcohol en el hombre, la ilusión de la creación capital. Está ahí para remplazarla. Y lo hace en toda una parte del mundo que habría debido creer en Dios y que ya no cree en él. El alcohol es estéril. Las palabras del hombre dichas en la noche de la borrachera se desvanecen con ella tan pronto como llega el día. La borrachera no crea nada, no va con las palabras, ofusca la inteligencia, la sosiega. He hablado bajo los efectos del alcohol. La ilusión es total: lo que uno dice, nadie lo ha dicho aún. Pero el alcohol no crea nada que permanezca. Es el viento. Como las palabras. He escrito bajo los efectos del alcohol, tenía una facultad para dominar la borrachera, que me venía sin duda del horror por la borrachera. Jamás bebía para estar borracha. Jamás bebía deprisa. Bebía todo el tiempo y nunca estaba borracha. Estaba retirada del mundo, inalcanzable, pero no borracha.


[...]

Un cuerpo alcohólico funciona como una central, como un conjunto de compartimentos
diferentes vinculados entre sí por la persona entera. El primer afectado es el cerebro. Es el pensamiento. La felicidad por el pensamiento primero y luego el cuerpo. Es ganado, empapado poco a poco, y transportado-, es la palabra: transportado. A partir de cierto tiempo se tiene la elección. Beber hasta la insensibilidad y la pérdida de la identidad, o permanecer en las primicias de la felicidad. Morir de algún modo cada día, o bien seguir huyendo.

[La vida material, traducción de Menene Gras Balaguer para Plaza &
Janés]

http://www.tijeretazos.net/Literaria/MDuras/MDuras013.htm

quarta-feira, agosto 01, 2007

Luz

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Charles Baudelaire, "O Spleen de Paris"

"Devemos andar sempre bêbados. Tudo se resume nisto: é a única solução. Para não sentires o tremendo fardo do Tempo que te despedaça os ombros e te verga para a terra, deves embriagar-te sem cessar. Mas com quê? Com vinho, com poesia ou com virtude, a teu gosto. Mas embriaga-te. E se alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas duma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunta-lhes que horas são:
«São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com virtude, a teu gosto.»

Charles Baudelaire, "O Spleen de Paris"

terça-feira, outubro 31, 2006

Alfabeto





Alfabeto

Estava eu no frio da morte a aproximar-se, quando pela derradeira vez me pus a fitar os seres, profundamente.

Ante o contacto mortal deste olhar de gelo, tudo o que não era essencial desapareceu. Entretanto eu ia-os perscrutando, querendo reter deles algo que nem o Morto pusesse largar. Eles adelgaçaram-se e acabaram por ficar reduzidos a uma espécie de alfabeto, mas um alfabeto capaz de servir no outro mundo, em qualquer mundo.

Aliviei-me assim do medo de me subtraírem o universo inteiro onde eu tinha vivido. Fortalecido com tal presa, contemplava-o invencido, e regressando o sangue, com a satisfação, às minhas arteríolas e veias, lentamente voltei a subir a vertente aberta da existência.

Henri Michaux, O retiro pelo risco Lisboa Fenda, pp. 34-35

segunda-feira, outubro 09, 2006

A um Deus desconhecido

A um Deus desconhecido


"O vento sussurrou um momento na relva e depois cresceu, trazendo consigo intensos odores a erva e a terra molhada, e a grande árvore agitou-se vivamente sob o vento. Joseph ergueu a cabeça e olhou para os seus enrugados ramos. Os olhos iluminaram-se-lhe em reconhecimento e desejou as boas vindas ao ser forte e simples que era seu pai, que pairara, com a sua juventude, como uma nuvem de paz, penetrando na árvore.

Ergueu a mão numa saudação. Disse baixinho: "Estou contente por ter vindo. Não me tinha apercebido até agora das saudades que sentia de si". A árvore mexeu-se ligeiramente. "Como vê é uma boa terra", continuou Joseph em voz baixa. "Vai gostar de cá estar". Abanou a cabeça para sacudir um resto de tontura, riu-se, em parte pelos seus pensamentos felizes, e em parte maravilhado com o seu súbito sentimento de irmandade para com a árvore... Pôs-se em pé, encaminhou-se para a velha árvore e beijou-lhe a casca"

John Steinbeck

A um Deus desconhecido

in http://soprarpalavrasaovento.blogspot.com/2006/10/um-deus-desconhecido.html

quinta-feira, agosto 24, 2006

Cor

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Olhar

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Luz

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sexta-feira, junho 23, 2006

Livros

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quinta-feira, maio 25, 2006

Infâncias

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terça-feira, maio 23, 2006

A linguagem com signos (sem serem linguísticos) ultrapassa em muito o ser humano, o símio-homem.

A linguagem com signos (sem serem linguísticos) ultrapassa em muito o ser humano, o símio-homem.

No entanto, gosto da ideia de Benveniste baseada na observação da dança das abelhas. Ou seja, a linguagem dos signos linguísticos é a única que (in)felizmente inclui o discurso indirecto. Daí sempre o seu carácter de tradução do passado e futuro (nunca do presente que já aconteceu). Algo de fora de nós que tende a reificar, a criar abstracções que podem ser tão cruéis como as armas.


Ver este texto sobre a dança das abelhas:

"As abelhas, segundo o experimento de Karl von Frisch, possuem um meio complexo para transmitir a mensagem: a distância e direção de localização do alimento, mas só executam os seus bailados para esse fim. Dizem que há comida, néctar ou pólen, para lá ou para cá, mas fora isso não articulam mais nada. Não há resposta e nem simbolização; a apreensão da mensagem é concreta. Vista a dança transmissora da mensagem por uma abelha, é necessário que essa vá até o alimento para informar a uma nova abelha o local onde ele se encontra. Não há memória da mensagem, a retenção leva a uma ação, à execução de um ato e se esgota aí. A capacidade abstrata do símbolo, ou seja, estar no lugar de outra coisa, representá-la na sua ausência, trazer e construir o pensamento para o outro: essas são propriedades humanas".
In:

segunda-feira, outubro 17, 2005

Nascemos com um traço de amor em nossos corações...

Nascemos com um traço de amor em nossos corações


"Nascemos com um traço de amor em nossos corações, que se desenvolve na medida em que o espírito se aperfeiçoa e que nos leva a amar o que nos parece belo sem que jamais nos tenha dito o que é. Além disso, o amor e a razão não são opostos porque o amor e a razão não são mais que a mesma coisa. Quanto maior o espírito, maiores as paixões."

Blaise Pascal