quinta-feira, junho 23, 2011

Falecimento de um dos fundadores deste Blog

Um dos fundadores deste blog, Luís Fernando Mesquita, faleceu no dia 9 de Junho de 2011.  Recordando a sua presença que deixou marcas nos amigos, as suas palavras ficam "para a posteridade".

domingo, março 06, 2011

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e assim nasceu. e falava. assiduamente.
era como o verão. que se abrira. recente.
como um clarão rubro de inocência. bebia
então taças tecidas de espanto. o
exílio.
iniciara-se. como uma teia. tecida lentamente. por
estranha e eterna aranha.
quando parido. por um período de vida.
fecundo. a mãe
linda. morrera ao pari-lo. que
eternidade vazia e vã. como a de
um deus. mítico ou não. que interessa isso.
para a posteridade.

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Manoel Cardôzo
lxª18.07.2003
De A Duração da Eternidade







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Duas leituras do mesmo poema
Em ressonância com o nome deste blogue.
Com a autorização do poeta.

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quinta-feira, fevereiro 03, 2011

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Do livro Voz equívoca (1975)

Manoel da Cunha e Mello, pseudónimo de Manoel Tavares Rodrigues Leal.

sábado, fevereiro 27, 2010

O olhar puro, olhar apenas.

O olhar puro, olhar apenas.
Um olhar que esquece (coloca entre parêntesis) o que está significando, a intenção, o sentido. Fica-se pelo fluxo, pela folha cheia de letrinhas sem qualquer significação linguística.

O ver, pelo contrário, já padece desse vício mental. Dessa actividade fervilhante e muitas vezes entrópica. Focaliza, delimita, organiza, pré-condiciona o acto, a percepção.


"Trata-se em o Visível e o Invisível (Le Visible et l'Invisible de Merleau-Ponty) de 'superar' a fenomenologia, em particular a da percepção. [...] A dificuldade vinha da ligação que a noção de experiência estabelece entre os sentidos e a consciência. [24] [...]

A visibilidade secreta, a visão de dentro que atapeta a visão de fora não possui [em Merleau-Ponty] um estatuto claro. [33]

Talvez estas dificuldades de Merleau-Ponty se liguem ao facto de ele não distinguir o olhar da visão. [47]

Para ver, é preciso olhar; mas pode-se olhar sem ver. Pode-se até ver mais, olhando; não só receber estímulos , descodificá-los (ver), mas fazer intervir o corpo na paisagem. Entre o 'ver passar barcos' e 'olhar os barcos que passam', há a diferença entre a distância (entre o sujeito e os barcos) e uma subtil aproximação (de qualquer coisa que vem da passagem dos barcos para aquele que olha, e que determina a sua atitude)." [48]

"Olhar - não ver, unicamente - é dizer as coisas - não ainda nomeá-las - construindo um continuum articulado na visão maciça; é fazer irromper movimentos imperceptíveis entre as coisas, juntá-las em unidades quase discretas, amontoados, aglomerados, tufos, abrindo na paisagem brechas imediatamente colmatadas pelas pequenas percepções que compõem as articulações insensíveis" [52].


José Gil, A imagem-nua e as pequenas percepções. Estética e fenomenologia, Lisboa, Relógio de Água, 1996.


sexta-feira, fevereiro 26, 2010

As crenças criam as percepções

As crenças criam as percepções. Estas são apenas meios físicos, equilibrios liquidos e electromagnéticos. Mas muitos insistem em querer navegar com rota fixa confiando em instrumentos grosseiros de tipo racional. Que também são crenças.

Mais vale, como fazem alguns, aceitar o nomadismo, o fluxo constante.

Digo eu, pensando em voz alta.

Talvez tentando discernir no meio da corrente mas de uma forma suave, modesta, tranquila. Acreditar confiando nas suas percepções múltiplas e pessoais (um olhar de criança) sem necessitar de passar pelo crivo mental do aceitável, um juíz externo.

quinta-feira, fevereiro 25, 2010

Muitas vezes, quando escrevo no "messenger", uma dúvida me assalta.

Muitas vezes, quando escrevo no "messenger", uma dúvida me assalta. Estarei falando mesmo com alguém ou será que o meu diálogo é também, ou acima de tudo, interior?

Perguntam-me muitas vezes, do outro lado da linha telefónica ou TVCabo que suporta a internet, porque estou calado. Melhor, um outro ser também diz para dentro mexendo dedos sobre terminais negros porque estou calado. Contudo, curiosamente estamos sempre calados no messenger.

O fascínio da escrita é exactamente esse. Ser um fluxo de dentro, um diálogo connosco. Um sentir mais perto sem o incómodo da representação do face a face.


Por isso, costumo dizer a muitos dos meus amigos internéticos de uma forma provocadora:

"Não há, no mundo, coisa mais real e íntima do que a INTERNET, a escrita no messenger. O mundo virtual é muito mais real do que o dia a dia.".


O mundo do messenger pode ser, nalguns casos, um mundo de intimidade em que estamos mais próximos de nós, mais em intimidade com o nosso ser do que no dia a dia que nos ausenta, que nos transforma em mercadorias virtuais como diria o velhinho K. Marx.

Como sou do tempo dos chats nos IRCs, da magia do on-line através da escrita, sinto que algo está a desaparecer com a WEBCAM (para muitos, foi o grande salto...). Ainda hoje, não tenho WEBCAM o que me transformou numa espécie de "dinossauro" do messenger.

Chego a pensar que a intimidade da WEBCAM não é mais o que o medo do contacto íntimo da escrita tal como os filmes pornográficos não são mais do que um exorcismo do receio de amar.
Uma necessidade de voltar ao mundo normal do "oral", do falado, do ter um rosto e, principalmemte para o sexo masculino, um corpo pela frente. Trata-se de voltar à percepção normal do mundo (eu diria televisiva) evitando assim a dobra de uma percepção interior que a escrita, o diálogo interior permitiria.

Também sinto que a paixão, que surgia naturalmente no messenger e no chat do IRC (aconteceu-me!), tem os dias contados. A escrita através do teclado abria a ilusão de um outro ser gémeo. Por isso, era fácil a paixão. Ao estar em diálogo interior, uma ligação directa emergia em que o que contava era apenas aquilo que somos: pura energia, pura energia procurando o mimetismo da criança, pura energia procurando o olhar infinito da mãe.

Tudo isto me veio à minha cabeça depois de ler este texto (que nem sei como classificar) da Clarice.


Fiquei sem palavras. Ainda estou sem elas.... Despido.

Tal como ela diz, na magia da escrita/voz interior "me sinto fatal a despeito de mim".

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"Como se eu procurasse não aproveitar a vida imediatamente, mas só a mais profunda, o que me dá dois modos de ser: em vida, observo muito, sou "ativa" nas observações, tenho o senso do ridículo, do bom humor, da ironia, e tomo um partido.

Escrevendo, tenho observações "passivas", tão interiores que "se escrevem" ao mesmo tempo em que são sentidas quase sem o que se chama de processo.

É por isso que no escrever eu não escolho, não posso me multiplicar em mil, me sinto fatal a despeito de mim".


Clarice Lispector, Para não esquecer, 5ª ed., São Paulo, Siciliano, 1992.

quarta-feira, fevereiro 24, 2010

As coisas. Eu devia vê-las, apenas vê-las

As coisas. Eu devia vê-las, apenas vê-las. E nesse momento mágico, a intensidade do olhar volta-se para dentro. Dobra-se abrindo um espaço enorme. Sente-se.

Vê-las até não poder mais. Vê-las até que algo se desloca. E uma paz enorme me invade.

Ver podendo dispensar tudo menos o que se vê.

Uma ciência do ver que não é nenhuma. É uma atenção em si. Um saber feito de saberes antigos.

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"Vive, dizes, no presente.

Vive só no presente.

Mas eu não quero o presente, quero a realidade. Quero as cousas que existem, não o tempo que as mede. O que é o presente? É uma cousa relativa ao passado e ao futuro. É uma cousa que existe em virtude de outras cousas existirem. Eu quero só a realidade, as cousas sem presente. Não quero incluir o tempo no meu esquema.

Não quero pensar nas cousas como presentes, quero pensar nelas como cousas.

Não quero separá-las de si-próprias, tratando-as por presentes. Eu nem por reais as devia tratar. Eu não as devia tratar por nada. Eu devia vê-las, apenas vê-las. Vê-las até não poder pensar nelas, vê-las sem tempo, nem espaço, ver podendo dispensar tudo menos o que se vê.

É esta a ciência de ver, que não é nenhuma."

Alberto Caeiro

terça-feira, fevereiro 23, 2010

Espelho Enevoado

"Há quatro mil anos, existia um jovem que morava perto de uma cidade rodeada de montanhas. O rapaz estudava para se tornar um xamã Tolteca, aprendia a sabedoria de seus ancestrais, mas discordava daquilo que aprendia. Algo dentro dele, dizia que existia algo mais além do que ele aprendia com seus professores.

Certo dia, enquanto descansava numa caverna, caiu num sono profundo e sonhou que via seu próprio corpo dormindo profundamente. Abandonou a caverna numa noite em que a lua nova encontrava-se no seu ápice. A noite estava clara, e ele ao olhar o céu viu milhares de estrelas. Um arrepio percorreu todo o seu ser, e ele sentiu que algo estava transformando sua vida para sempre. Olhou para suas mãos, sentiu o seu corpo e escutou sua própria voz que sai de seus lábios dizendo: “Sou feito de luz e de estrelas.

Visualizou novamente as estrelas no céu e percebeu que não eram estrelas que criavam a luz, mas antes a luz que criava as estrelas. “Tudo é feito de luz”, acrescentou ele, “e o espaço no meio não é vazio.” Ele soube tudo o que existe num ser vivo, e que a luz é a mensageira da vida, porque está viva e contém todas as informações.

Passou a compreender que embora fosse feito de estrelas, ele não era essas estrelas. “Sou o que existe entre as estrelas”, pensou. Chamou as estrelas de tonal e a luz entre elas, de nagual, e soube que o que criava a harmonia e o espaço entre os dois é a Vida ou Intenção. Sem a Vida, o tonal e o nagual não poderiam existir. A Vida é à força do absoluto, do supremo, do Criador que cria tudo.

Foi isso o que ele descobriu: tudo o que existe é uma manifestação do ser que denominamos Deus. Tudo é Deus. E ele chegou à conclusão de que a percepção humana é apenas a luz que percebe a luz. Também viu que a matéria é um espelho – tudo é um espelho que reflete e cria imagens dessa luz – e o mundo da ilusão, o Sonho, é apenas fumaça que não permite enxergarmos o que realmente somos. “O verdadeiro nós é puro amor, pura luz”, disse ele.

Essa compreensão mudou sua vida. Uma vez que ele soube quem realmente era, olhou ao redor para os outros seres humanos e para o restante da natureza e ficou surpreso com o que viu. Viu a ele mesmo em tudo – em cada ser humano, em cada animal, em cada árvore, na água, na chuva, nas nuvens, na terra. E viu que a Vida misturava o tonal e o nagual de formas diferentes para criar bilhões de manifestações da Vida.

Naqueles poucos momentos ele compreendeu tudo. Ficou muito excitado, e seu coração encheu-se de paz. Mal podia esperar para contar a seu povo o que descobrira. Mas não encontrava palavras para explicar. Tentou falar com os outros, mas eles não conseguiam entender. Eles haviam percebido que o rapaz havia mudado, que algo deslumbrante se irradiava da sua voz e de seus olhos. Observaram que ele não julgava mais as pessoas e as coisas. Ele não se parecia mais com os outros.

O rapaz entendia as outras pessoas muito bem, mas ninguém conseguia entende-lo. Acreditavam que ele fosse a encarnação viva do Criador, ele sorriu quando escutou estes comentários à cerca de sua pessoa, e lhes falou: “É verdade. Sou o Criador, Mas vocês também o são. Somos o mesmo, eu e vocês. Somos imagens de luz. Somos Deus.” Mas mesmo assim, as pessoas não o compreendiam.

Havia descoberto que era um espelho para as outras pessoas, um espelho no qual podia observar a si mesmo. “Todos nós somos um espelho.” Viu a si mesmo em todos, mas ninguém o viu como eles mesmos. Compreendeu que as outras pessoas estavam sonhando, mas sem consciência, sem saber o que realmente eram. Não podiam vê-lo como eles mesmos porque havia um nevoeiro entre os espelhos. E essa parede era construída pela interpretação das imagens de luz – o Sonho dos seres humanos.

Então ele percebeu que logo iria esquecer tudo o que aprendera. Queria lembrar-se de todas as visões que tivera; portanto decidiu chamar a si mesmo de Espelho Enevoado, para que sempre soubesse que a matéria é um espelho e que a névoa do meio é o que nos impede de saber quem somos. Ele disse: “Sou Espelho Enevoado, porque estou vendo a mim mesmo em todos vocês, mas nós não reconhecemos um ao outro por causa do nevoeiro entre nós. Esse nevoeiro é um Sonho, e o espelho é você, o Sonhador.”

MIguel Ruiz, Os quatro compromissos. O livro da filosofia tolteca.

Ver aqui o livro completo:

quinta-feira, fevereiro 18, 2010

Carpe Diem

"Carpe Diem (em Latim) significa " colha o dia " ou " aproveita o momento ".

Essa regra de vida pode ser encontrada em "Odes" (I, 11.8) do poeta romano Horácio (65 - 8 AC), onde se lê:

Carpe diem quam minimum credula postero

(colha o dia, confia o mínimo no amanhã)."

Este presente parece sempre fugir entre as mãos.

Os gregos antigos, com razão, falavam de duas formas deste presente, do instante, do agora mesmo.

O tempo podia ser tanto o irreversível Chronos (deus do tempo) como o reversível Aion que é a eternidade, tudo recomeça em cada momento.

"Aion é o tempo superficial dos acontecimentos incorporais tomado em sua relação com o devir: remete ao passado e ao futuro simultaneamente.

Contrapõe-se a ele Cronos, que representa o tempo tomado em sua relação com o presente vasto e profundo, e que transcorre através da flecha homogênea e inexorável do tempo: do passado para o futuro – um tempo localizável, espacializado "

Ver aqui:

http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum...

O segundo, o cronos, passou a ser dominante. Mas na voz dos poetas é encarado com desconfiança.

É um tempo medido, é o tempo do trabalho mercadoria, pesado. Em que o nosso corpo/tempo é negócio.

O outro, o eterno, fica nos nossos silêncios. Nos nosso sonhos, nas crianças, nos animais, nos que sentem.

Também está na magia do cinema quando não é mercadoria dos centros comerciais e das pipocas.

segunda-feira, fevereiro 15, 2010

"Rapture" - Uma música de Laura Veirs



Ouvir esta música é uma experiência fascinante.
Uma meditação sentida sobre o mundo que nos rodeia.

Ou melhor, sobre o que resta da nossa
experiência do mundo quando abundam as mediações da imediatez: fotos,
gravações, vídeos. etc.

"And doesn’t the tree Write great poetry? Doing itself so well"

O que resta dessa experiência fundamental, única que passa por pensar,
sentir, saber olhar... Com tempo. Um olhar distraído. Sem se dar conta.

Como diz o poema, "Love of color, sound and words
Is it a blessing or a curse?"

"Rapture" de Laura Veirs

"With photographs
And magnetic tape
We capture
Pretty animals in cages
Pretty flowers in vases
Enraptured

And doesn’t the tree
Write great poetry?
Doing itself so well

Do you blame Monet?
His gardens in giverny
He captured
And lovely basho
His plunking ponds and toads
Enraptured

The fate of Kurt Cobain
Junk coursing through his veins
And young Virginia Woolf
Death came and hung her coat

Love of color, sound and words
Is it a blessing or a curse?
Enraptured"

Laura Veirs


quarta-feira, novembro 18, 2009

"Probar la soledad sin que el vinagre haga torcer mi boca"

Confesso que, muitas vezes, tive a sensação aguda de solidão. Como se tudo e todos me abandonassem. Uma sensação de solidão dolorosa. Derivada, muitas vezes, de não ser capaz de dizer claramente o quanto amava os meus mais próximos. Com o fluxo dos anos, aprendi a não dar muita importância. A saber esperar. Aprender a aceitar.

Como diz o psicanalista Jacques Lacan, na solidão, sente-se a lacuna, o vazio que os outros tentam preencher desesperadamente com o Eu. Este Eu, criado no mimetismo da infância, é uma "instância de desconhecimento, de ilusão, de alienação, sede do narcisismo. É o momento do Estádio do Espelho". Um Eu criado pelo nosso Imaginário, "juntamente com fenómenos como o amor, o ódio, a agressividade" (em Jacques Lacan - Wikipedia).

Ainda de acordo com Jacques Lacan, somos seres em angústia pela nossa ligação demasiado intensa, mimética com a mãe enquanto crianças. Somos, na verdade, o animal que passa mais tempo nesse estado de osmose depois de nascer. Por isso, mais tarde o apaixonado, numa regressão sublime, sente-se como uma criança que procura desesperadamente o olhar do ser amado. Sente-se desamparado procurando sempre o outro, o amor, a todo o momento. Num impulso biológico muito forte.

Desta forma, a solidão faz-nos sentir autênticamente a condição humana. Essa estranheza que, se vivida directamente e com aceitação, nos abre as portas da percepção de um novo mundo. Essa consciência de estar aqui como que abandonados, como hóspedes transitórios da Terra como dizia Heidegger, faz parte da nossa condição básica de humano que tentamos evitar no nosso quotidiano normalizado.


Essa consciência pode ser a fonte de uma vida mais profunda e intensa. A solidão assumida, muitas vezes rodeada de muitas solidariedades subterrâneas, pode-nos abrir para o mundo de uma forma fantástica. Podemos aceder a outras percepções que, enquanto mergulhados na euforia do social, tendemos a esquecer. O hinduísmo e o budismo (e os nossos místicos ocidentais como San Juan de la Cruz, Jesus, etc...) descrevem de forma admirável esse caminho pessoal de meditação.

Como diz Octávio Paz, pode-se provar a solidão sem ficar azedo.


"probar la soledad sin que el vinagre
haga torcer mi boca, ni repita
mis muecas el espejo, ni el silencio
se erice con los dientes que rechinan"

(Vida Sencilla)

domingo, novembro 30, 2008

Um texto curioso de Carlos Castaneda

Carlos Castaneda. Estamos perante um autor classificado, por muitos, como estranho e esotérico.

Parece-me contudo que pode ser interessante tentar perceber, na medida do possível, porque é que foi um dos inspiradores do movimento New Age nos anos 60 do séc. XX. Um movimento que marca sem dúvida a nossa forma de viver actual.

Nesse sentido, encontrei um outro texto que nos revela o centro do olhar de Castaneda.


"Uma das mais contundentes e urgentes revelações do escritor Carlos Castaneda foi feita apenas em suas últimas obras, primeiramente no incerto livro “Passes Mágicos” (pg. 101 da primeira edição brasileira, se não me falha) e depois mais detalhadamente no capítulo “Sombras de Barro” de “O lado ativo do infinito”.

Nessas páginas é explicada a figura do predador natural do homem. Como sabemos, no universo conceitual desse autor a consciência é um elemento do ambiente, um brilho que se forma ao redor do “ponto de aglutinação” e se desdobra na medida em que se vive, pela razão de existir. Os videntes da linhagem tolteca teriam visto que no ser humano há uma capa brilhante de consciência que permeia o ovo luminoso, e que essa capa é devorada, colhida, incessantemente, pelo predador, até que só reste uma pequena franja luminosa por sobre os pés. Essa franja seria o centro da auto-reflexão, do eu, do diálogo interno, e permitira o homem a continuar vivendo, mas só vivendo. Isso se enquadra perfeitamente nas violentas críticas à auto-importância e vaidade que o autor tece durante toda a sua obra.

As tais sombras voadoras, um tipo de ser inorgânico hostil à humanidade, passariam, para manter o controle, “informações telepáticas” ao homem, ditando muitas vezes a sua forma de pensar, confundindo sua mente. Daí que a estratégia do guerreiro é manipular de tal modo sua conscientização, vencendo a auto-reflexão, até que ela passe a ser impalatável ao predador. Obedecendo a cada comando do infinito, o guerreiro se agarra a uma forma maior que si mesmo, e a partir daí a capa brilhante de consciência, tão vivaz durante a infância, passa a se reacender e acumular-se, progressivamente. Seria uma maneira do universo – e com este ninguém brinca - testar e desafiar o homem, tornando-o apto a cumprir seu destino mágico. Bom, não vou entrar em detalhes, quem quiser que se remeta às passagens citadas, mas o que queria enfatizar é que, na visão desse autor, não é necessariamente você quem está pensando nesse momento, mas sim o predador que empresta sua mente através da “instalação forânea” que mantém em seu rebanho."

Ver aqui:

http://blog.cybershark.net/miguel/index.php/page/2- /

A fenda aberta


"Oh não, um escritor não pode desejar ser "conhecido", reconhecido.


O imperceptível, característica comum da mais alta velocidade e da maior lentidão.

Perder o rosto, saltar ou furar o muro, limá-lo muito pacientemente, escrever não tem outro fim.

É o que Fitzgerald chamava verdadeira ruptura: a linha de fuga, não a viagem nos Mares do Sul, mas a aquisição de uma clandestinidade (mesmo se se deve devir animal, devir preto ou mulher).

Ser finalmente desconhecido, como muito pouca gente o é, é isso, trair.

É muito difícil deixar de ser conhecido, mesmo da porteira, ou no bairro, o cantor sem nome, o ritornelo.


[...] O herói dissipa-se literalmente, geograficamente. O belo texto de Fitzgerald, THE CRACK UP, diz:
"Eu sentia-me como os homens que via nos combois de subúrbio, em Great Neck, já lá vão quinze anos, homens que não estavam interessados em saber se o mundo ia afundar-se num caos, no dia seguinte, desde que a sua própria casa fosse poupada. Eu passava a ser como eles, coisa gorducha como as que sabem dizer:
- Lamento muito, mas negócios são negócios. Ou:
- Você devia ter pensado nisso, antes de os problemas surgirem. Ou:
- O assunto não me diz respeito."

[F. Scott Fitzgerald, A FENDA ABERTA, Hiena Editora, Lisboa, 1986.]


Há todo um sistema social que poderíamos chamar sistema muro branco - buraco negro.
Estamos todos pregados no muro das significações dominantes, estamos sempre enterrados no buraco da nossa subjectividade, o buraco negro do nosso Eu que nos é o mais caro de tudo.
Muro onde se inscrevem todas as determinações objectivas que nos fixam, nos encaixilham, nos identificam e nos fazem reconhecer; buraco onde nos alojamos, com a nossa consciência, os nossos sentimentos, as paixões, os nossos pequenos segredos demasiado conhecidos, o nosso desejo de os fazer conhecer.
Ainda que o rosto seja um produto deste sistema, é uma produção social: grande rosto de faces brancas, com o buraco negro dos olhos.
As nossas sociedades têm necessidade de produzir rosto.
Cristo inventou o rosto.



O problema de Miller (que já era o de Lawrence): como desfazer o rosto, libertanto em nós as escavadoras que traçam linhas de devir?


Como passar o muro, evitando ressaltar, para trás, ou ser esmagados?


Como sair do buraco negro, em vez de girar no fundo, que partículas fazer sair do buraco negro?




Como quebrar mesmo o nosso amor para se ser finalmente capaz de amar?


Como devir imperceptível?




"Je ne regarde plus dans les yeux de la femme que je tiens dans mes bras, mais je les traverse à la nage, tête, bras et jambes en entier, et je vois que derrière les orbitres de ces yeux s'étend un monde inexploré, monde de choses futures, et de ce monde toute logique est absente… L'œil, libéré du soi, ne révèle ni n'illumine plus, il court le long de la ligne d'horizon, voyageur éternel et privé d'informations… J'ai brisé le mur que crée la naissance, et le tracé de mon voyage est courbe et fermé, sans rupture… Mon corps entier doit devenir rayon perpétuel de lumière toujours plus grande… Je scelle donc mes oreilles, mes yeux, mes lèvres. Avant de redevenir tout à fait homme, il est probable que j'existerai en tant que parc…" [Henry Miller, TROPIQUE DU CAPRICORNE, éd. du Chêne, p. 177.] "


Passagem de DIALOGUES (de Gilles Deleuze e Claire Parnet, Flammarion, Paris, 1977, pp.56-58).

Tradução de Edmundo Cordeiro

sábado, novembro 01, 2008

Cuando el pensamiento analítico...

"Cuando el pensamiento analítico - el cuchillo - es aplicado a la experiencia, siempre hay algo a lo que se le da muerte en el proceso. Esto es cosa entendida en las artes. Mark Twain, después de haber reunido los conocimientos suficientes como para pilotear una embarcación en el Mississippi, descubrió que el río había perdido su belleza".

Robert M. Pirsig

Zen y el arte del mantenimiento de la motocicleta

domingo, outubro 12, 2008

"Tenho desejado afastar-me" Dylan Thomas

Tenho desejado afastar-me
Do silvo da mentira gasta e sibilante
E do grito contínuo dos velhos terrores
Que ficam mais terríveis à medida que o dia
Atravessa as montanhas mergulhando no mar profundo...

[...]

Tenho desejado afastar-me, mas tenho medo;
Alguma vida, ainda não gasta, pode explodir
Da velha mentira que arde no chão,
E, crepitando no ar, deixar-me meio cego.


[...]


Versão original:

I Have Longed To Move Away
by Dylan Thomas

I have longed to move away
From the hissing of the spent lie
And the old terrors' continual cry
Growing more terrible as the day
Goes over the hill into the deep sea;

I have longed to move away
From the repetition of salutes,
For there are ghosts in the air
And ghostly echoes on paper,
And the thunder of calls and notes.

I have longed to move away but am afraid;
Some life, yet unspent, might explode
Out of the old lie burning on the ground,
And, crackling into the air, leave me half-blind.
Neither by night's ancient fear,
The parting of hat from hair,
Pursed lips at the receiver,
Shall I fall to death's feather.
By these I would not care to die,
Half convention and half lie.

segunda-feira, julho 14, 2008

Eu não sou eu.
..........................Sou este
que vai a meu lado sem eu vê-lo;
que, por vezes, vou ver,
e que, às vezes, esqueço.
O que se cala, sereno,quando falo,
o que perdoa, doce, quando odeio,
o que passeia por onde estou ausente,
o que ficará de pé quando eu morrer.


Juan Ramón Jimenez

sábado, julho 05, 2008

É o pequeno eu que teme pela sua morte...

"É o pequeno eu que teme pela sua morte e inventa para si sobrevivências morais, transmigratórias ou celestes. É ele que se compraz com o poder e o reconhecimento. É ele que mergulha nos jogos do capital para mascarar sua impotência absoluta.

Mas o movimento da cultura não cessa de produzir a morte do pequeno eu. Ali onde transparece o a-fundamento e o afundamento do eu, a cultura é uma força viva; lá onde o eu triunfa, a cultura está morta ou claudicante, subjugada por forças de outra natureza. Não, a cultura não se exprime no conhecimento de nomes, formas e fórmulas, e sequer no conhecimento enquanto tal. Ao contrário, ela se exprime na conquista de uma potência que está muito além do eu e suas propriedades. Inversamente, esse homem soberano, criador, esse iluminado luminoso que é a finalidade da cultura só se torna possível se a cultura é uma força viva.

Mas é isso que se apresenta no campo social capitalista? Seria o capitalismo a morte da própria cultura?"

in http://triagem.blogspot.com/2005/05/cultura-e-mort- e-3.html

quinta-feira, junho 19, 2008



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Transe. Assemblagem, caixa relicário. Madeira, palha, acrílico, sapatos, etc., 90x17x70cm+-,2001.

Por Luís de Barreiros Tavares

segunda-feira, maio 05, 2008

Xamã








'Xamã', painting by Luís de Barreiros Tavares (Luís Tavares). The colors of the 'Xamã'. Técnica mistas/tela, 26x33cm, 1999.
Colecção privada.

quinta-feira, maio 01, 2008

O Eco

"Alta noite, o pobre animal aparece no morro, em silêncio.
O capim se inclina entre os errantes vaga-lumes;
pequenas asas de perfume saem de coisas invisíveis:
no chão, branco de lua, ele prega e desprega as patas, com sombra.

Prega, desprega e pára.
Deve ser água, o que brilha como estrela, na terra plácida.
Serão joias perdidas, que a lua apanha em sua mão?
Ah!... não é isso...

E alta noite, pelo morro em silêncio, desce o pobre animal
sozinho.

Em cima, vai ficando o céu. Tão grande. Claro. Liso.
Ao longe, desponta o mar, depois das areias espessas.
As casa fechadas esfriam, esfriam as folhas das árvores.
As pedras estão como muitos mortos: ao lado um do outro,
mas estranhos.
E ele pára, e vira a cabeça. E mira com seus olhos de homem.
Não é nada disso, porém...

Alta noite, diante do oceano, senta-se o animal, em silêncio.
Balançam-se as ondas negras. As cores do farol se alternam.
Não existe horizonte. A água se acaba em ténue espuma.
Não é isso! Não é isso!
Não é a água perdida, a lua andante, a areia exposta...
E o animal se levanta e ergue a cabeça, e late... late...

E o eco responde.

Sua orelha estremece. Seu coração se derrama na noite.
Ah! para aquele lado apressa o passo, em busca do eco."


Cecília Meireles, Antologia Poética, Lisboa, Relógio D'Água,2002, p.56.

terça-feira, abril 08, 2008

A perfeição nasce do eco dos teus passos.

"A perfeição nasce do eco dos teus passos,
E a tua presença acorda a plenitude
A que as coisas tinham sido destinadas".

Sophia de Mello Breyner


Um eco que me liga à terra. Não é fácil ouvir esse eco pois exige treino e disciplina. E insistência. Por fim, surge e acorda a sensação de plenitude. De ligação a uma força maior. Como se fosses parte de um todo infinito.

Há dias em que ele surge.. O eco. No momento em que ando. Passo atrás de passo. Pouco a pouco o ritmo torna-se hipnótico. E, sem o saber, parece que não ando mas voo. Como se fosse um pássaro planando...

quarta-feira, abril 02, 2008

Hiroshima Mon Amour!...


Técnica mista sobre tela, 150x100cm, 2001
Luís de Barreiros Tavares
colecção do autor

domingo, março 23, 2008

Aquele amor

"Aquele Amor"

Yann Andréa


"Continuo em ter dificuldade em dizer a palavra. Não conseguia dizer o nome dela. Só escrevê-lo. Nunca consegui tratá-la por “tu”. Por vezes ela teria gostado. Que eu a tratasse por “tu”, que a chamasse pelo seu nome. Não me saía da boca, não conseguia. (...) E essa impossibilidade de a chamar pelo nome, acho que vem disto: primeiro li o apelido, olhei para o apelido, o nome e o apelido. E esse nome encantou-me imediatamente. Esse pseudónimo literário. Esse apelido emprestado. Esse nome de autor. Esse nome agradava-me simplesmente. Esse nome agrada-me infinitamente (...)

Sou um leitor. O leitor primordial, visto amar todas as palavras, integralmente, sem qualquer contenção. E esse nome de cinco letras, DURAS, amo-o absolutamente. Caiu-me em cima. Nunca mais a deixei e não a consigo deixar. Nunca. E ela também não.


Mantém-me fechado no quarto escuro. Não suporta que qualquer outra pessoa possa ver-me. Quer ser a preferida. A única. De todos. De toda a gente. E eu, do mesmo modo, sou o preferido.

Gostamos um do outro.

Gostamos infinitamente um do outro.

Gostamos um do outro de modo absoluto.


Você morreu a 3 de Março de 1996 às 8 horas e 15, na sua cama, na rua Saint-Benoît. Eu não vim. Deixei-a. Você morreu. Eu não. Eu fiquei cá e estou aqui a escrever-lhe. E isto fá-la rir: mas por quem é que ele se toma, por um escritor, esta agora. Você ri. E diz: não tem mais nada para fazer, só escrever, não interessa o quê, continue, tem um tema maravilhoso, um tema de ouro, sou eu que lho digo, vá, pare de se armar em parvo, escreva, não vale a pena matar-se, não se faça de imbecil.

Qual é o tema.

E então aparece o sorriso. A sua cara torna-se numa cara de criança, uma criança que sabe, que sabe tudo na inocência perfeita de um ser inaudito. Nesse sorriso da cara toda, da cabeça toda, do espírito todo, do coração todo, poder-se-ia dizer, você diz: o tema sou eu.


Se calhar não devia ter dormido, se calhar devia tê-la ouvido mais, estar mais presente, amar mais, nunca o fazemos o suficiente, não podemos imaginar que o último dia está muito próximo, não podemos porque você fala noites a fio, deveríamos, sim, fazer mais, mas o quê, inventar uma espécie de amor ainda maior do que aqueles livros, mas como fazê-lo, como é possível. Certas noites eu queria dormir e dizia-lhe para se ir embora, para ir para o seu quarto, sozinha perante a morte, certas noites já não aguentava mais, mandava-a embora, fazia-o e nunca uma queixa, ia para o seu quarto furiosa à espera de morrer. No dia seguinte voltava.

Estamos sozinhos fechados neste apartamento da rua Saint-Benoît. Esperamos pelo último dia. Só sabemos isso".

Excertos – Yann Andréa, Aquele Amor, Lisboa, Quetzal Editores [acerca do seu amor pela escritora e cineasta Margerite Duras]

quinta-feira, março 20, 2008


Fétiche, 167x45x50cm, acrílico e esmalte sobre porta de janela antiga assente em base rotativa, 2001. Cada imagem encontra-se numa das faces da porta.
Escultura/instalação
Luís de Barreiros Tavares (Luís Tavares)
Colecção particular

domingo, março 16, 2008

Olhar

"Trata-se em o Visível e o Invisível (Le Visible et l'Invisible de Merleau-Ponty) de 'superar' a fenomenologia, em particular a da percepção. [...] A dificuldade vinha da ligação que a noção de experiência estabelece entre os sentidos e a consciência. [24] [...]

A visibilidade secreta, a visão de dentro que atapeta a visão de fora não possui [em Merleau-Ponty] um estatuto claro. [33]

Talvez estas dificuldades de Merleau-Ponty se liguem ao facto de ele não distinguir o olhar da visão. [47]

Para ver, é preciso olhar; mas pode-se olhar sem ver. Pode-se até ver mais, olhando; não só receber estímulos , descodificá-los (ver), mas fazer intervir o corpo na paisagem. Entre o ver passar barcos e olhar os barcos que passam, há a diferença entre a distância (entre o sujeito e os barcos) e uma subtil aproximação (de qualquer coisa que evm da passagem dos barcos para aquele que olha, e que determina a sua atitude)." [48]

"Olhar - não ver, unicamente - é dizer as coisas - não ainda nomeá-las - construindo um continuum articulado na visão maciça; é fazer irromper movimentos imperceptíveis entre as coisas, juntá-las em unidades quase discretas, amontoados, aglomerados, tufos, abrindo na paisagem brechas imediatamente colmatadas pelas pequenas percepções que compõem as articulações insensíveis" [52].

José Gil, A imagem-nua e as pequenas percepções. Estética e fenomenologia, Lisboa, Relógio de Água, 1996.

O olhar puro, olhar apenas.

Um olhar que esquece (coloca entre parêntesis) o que está significando, a intenção, o sentido.

Fica-se pelo fluxo, pela folha cheia de letrinhas sem qualquer significação linguística. O ver, pelo contrário, já padece desse vício mental. Dessa actividade fervilhante e muitas vezes entrópica. Focaliza, delimita, organiza, pré-condiciona o acto, a percepção.

quarta-feira, março 12, 2008

é rio de luz vertical
que verte
o ocidental verão estrénuo
e suas antigas margens
ladeiam o rio e
a luz
escorre
então suas breves imagens
se malogram
na geração do gume
do olhar
que já mergulhara
nas vísceras do mar

Manoel de Souza-Valente
lxª2007/06/26

domingo, março 09, 2008

Maria Gabriela Llansol

Acabou de falecer Maria Gabriela Llansol. Uma escritora.
"... penso em fazer esta experiência: levantar-me numa manhã de inverno, quando ainda fizer escuro [...], ver o dia levantar-se, clarear, eu sempre sentada na minha cadeira de balouço. Começar a mover-me, a dar passos em todos os pequenos percursos que me ligam à casa e, num dado momento, ter a consciência, envolta em cálice, de que o dia nasce..."

(Maria Gabriela Llansol, Do caderno 5 do espólio, 1978).

Ver aqui: http://espacollansol.blogspot.com/2008/03/conscincia-envolta-em-clice-de-que-o.html


Obra: http://pt.wikipedia.org/wiki/Maria_Gabriela_Llansol

quinta-feira, março 06, 2008

Poderemos acaso erguer uma torre de sossego

Poderemos acaso erguer uma torre de sossego
como se estivéssemos no interior do mundo? Nós somos descendentes dos répteis
e por isso amamos o letargo solar entre sombras vegetais
Poderíamos assim ouvir o rumor da ausência
como um rosto entre longínquas nascentes
e a pulsação das pedras o obscuro júbilo do fogo
o sorriso cintilante de um regato
Estaríamos na intimidade do olvido
como a pura ignorância de uma sombra lúcida
Seríamos uma erva escrita pela saliva da terra
numa adequação vibrante e sóbria
Veríamos ascender o obscuro em lâmpadas nuas
e toda a espessura seria dúctil e porosa
A identidade encontraria a origem numa flora leve
a hospitalidade de uma terra
nas constelações de argila basalto e esterco

António Ramos Rosa, Génese, Lisboa, Roma Editora, 2007, p.71

terça-feira, março 04, 2008

Meditation

"He whose happiness is within, whose contentment is within, whose light is all within, that yogui, being one with Brahman, attains eternal freedom in divine consciousness".

Bhagavad - Gita

"When I first heard about meditation, I had zero interest in it. I wasn't even curious. It sounded like a waste of time.
What got me interested, though, was the phrase "true hapiness lies within". At first I tought it sound kind of mean, because it doesn´t tell you where the "within" is, or how to get there. But still it had a ring of truth. And I began to think that maybe meditation was a way to go within.

I looked into meditation, asked some questions, and started contemplating different forms. At that moment, my sister called and said she had been doing Transcendental Meditation for six months. There was something in her voice. A change. A quality of happiness. And I thought, 'That's what I want'.

So in July 1973 I went to the Transcendental Meditation center in Los Angeles and met an instructor, and I liked her. She looked like Doris Day. And she taugh me this technique. She gave me a mantra, which is a sound-vibration-thought.

She took me into a little room to have my first meditation. I sat down, closed my eyes, started this mantra, and it was as if I were in an elevator and the cable had ben cut. Boom! I fell into bliss - pure bliss. And I was just in there. Then the teacher said. "It's time to come out; it's been twenty minutes." And I said, "IT'S ALREADY BEEN TWENTY MINUTES?!" And she said, "Shhhh!" because other people were meditating. It seemed so familiar, but also so new and powerful. After that, I said the word "unique" should be reserved to that experience."




David Lynch, Catching the Big Fish. Meditation, Conscious, and creativity.New York, Jeremy P. Tarcher/Penguin,2007, p. 3-4.




David Lynch - realizador de cinema.
Filmes: Eraserhead, The Elephant Man, Wild at Heart, Twin Peaks, Blue Velvet, Mulholland Drive e Inland Empire.

domingo, março 02, 2008

A monk asked Pai-chang (720-814), “Who is the Buddha?” Pai-chang answered: “Who are you?”

quinta-feira, fevereiro 28, 2008

Galáxia nº 75
http://s132.photobucket.com/albums/q40/hanshino/galaxies/?action=view&current=galaxy75.jpg

"He, whose happiness is within, whose contentment is within, whose light is all within, that yogui, being one with Brahman, attains eternal freedom in divine consciousness".

Bhagavad - Gita


quinta-feira, fevereiro 21, 2008

e assim nasceu. e falava. assiduamente.
era como o verão. que se abrira. recente.
como um clarão rubro de inocência. bebia
então taças tecidas de espanto. o
exílio.
iniciara-se. como uma teia. tecida lentamente. por
estranha e eterna aranha.
quando parido. por um período de vida.
fecundo. a mãe
linda. morrera ao pari-lo. que
eternidade vazia e vã. como a de
um deus. mítico ou não. que interessa isso.
para a posteridade.

Manoel Cardôzo
lxª18.07.2003

terça-feira, fevereiro 05, 2008

Fail

"Muitas vezes eu desisti sem mesmo tentar"



My body doesn't move out or move back. Never.

The body (my body) stays in, it stays on in - unmoving.

Nothing else ever.
There's never been anything else.

I've never tried anything else, never failed at anything else.

But it doesn't matter really.

And I'll try again, I'll fail again.
Always

I'll fail better than I did before.
Always...
.........

Inspirado na citação de Samuel Beckett
"Ever tried. Ever failed. No matter. Try again. Fail again. Fail better".
Ver aqui:
http://samuel-beckett.net/w_ho.htm

sábado, fevereiro 02, 2008

Nunca percas um segundo na tua vida a tentar mudar o que é imutável. Nunca exageres até ao ponto de perder uma vida para querer mudar um segundo naquilo que é imutável. Aceita-te.

Aceita.
"Devemos andar sempre bêbados. Tudo se resume nisto: é a única solução. Para não sentires o tremendo fardo do Tempo que te despedaça os ombros e te verga para a terra, deves embriagar-te sem cessar. Mas com quê? Com vinho, com poesia ou com virtude, a teu gosto. Mas embriaga-te. E se alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas duma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunta-lhes que horas são: «São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com virtude, a teu gosto.»

Charles Baudelaire, Spleen de Paris, Relógio d’Água, Lisboa, 1991, p. 105

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

Eu vazio ou cheio?

Eu não sabia o que fazer nem o que dizer e eis que apelei ao amor-próprio. Eis que apelei à nossa infeliz condição humana baseada numa procura do preencher deste vazio impreenchível.

segunda-feira, janeiro 21, 2008

Laços

Laços - Toranja

Andamos em voltas rectas Na mesma esfera, Onde ao menos nos vemos Porque o fumo passou. A chuva no chão revela, Os olhos por trás. Há que levar o que restou E o que o tempo queimou. Tens fios de mais a prender-te as cordas, Mas podes vir amanha, Acreditar no mesmo Deus Tens riscos demais, A estragar-te o quadro. Se queres vir amanha, Acreditar no mesmo Deus Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços.. Andamos em voltas rectas Na mesma esfera Mas podes vir amanhã Se queres vir amanhã Podes vir amanhã Tens riscos de mais A estragar-me a pedra Mas se vieres sem corpo À procura de luz Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços, meu amor! Devolve-me os laços, meu amor! Meu amor Meu amor...

Toranja

Ver aqui: http://www.youtube.com/watch?v=zIfKivOzpYw


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"Andamos em voltas rectas Na mesma esfera"

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Estamos sempre, sempre na mesma, mesmíssima esfera com a ilusão real de contacto, em voltas rectas . Muitas vezes acontece que essa ilusão parece concretizar-se.
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"Onde ao menos nos vemos Porque o fumo passou".

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Acontece e deve ser justamente tratado como um "acontecimento". Deve ser celebrado, com cuidado para não riscar. Não partir. Sem euforias. Como ponto de partida. Mudança.

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"Tens riscos de mais A estragar-me a pedra Mas se vieres sem corpo À procura de luz".


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Com esse "acontecimento" de luz e energia, a esfera parece, parece abrir-se. Sem corpo porque com o autêntico corpo. Procurando a luz. Sempre.


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"A chuva no chão revela, Os olhos por trás. Há que levar o que restou E o que o tempo queimou".


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Os olhos que olham, olham com intensidade até chorarem. E finalmente verem. Depois pouco resta, e esse pouco basta. É imenso.

quarta-feira, janeiro 16, 2008

E uma vontade de rir nasce do fundo do ser

"E uma vontade de rir nasce do fundo do ser. E uma vontade de ir, correr o mundo e partir, a vida é sempre a perder"

http://www.youtube.com/watch?v=9AvUeoH81ZI


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Uma vontade de rir da nostalgia do ser. Ela, essa vontade que vem das tripas, é o único antídoto para a tristeza. E a vontade de ir é uma força imensa que nos arrasta...


Uma vontade de quem nada tem a perder senão a sua não vida.

segunda-feira, janeiro 14, 2008

Caminhos

"Qualquer caminho é apenas um caminho e não constitui insulto algum - para si mesmo ou para os outros - abandoná-lo quando assim ordena o seu coração. (...) Olhe cada caminho com cuidado e atenção. Tente-o tantas vezes quantas julgar necessárias...

Então, faça a si mesmo e apenas a si mesmo uma pergunta: possui esse caminho um coração? Em caso afirmativo, o caminho é bom. Caso contrário, esse caminho não possui importância alguma."


C. Castaneda

terça-feira, janeiro 08, 2008

Sexo e amor

Continuando o debate do log anterior, encontrei um resumo de um livro do sociólogo italiano Francisco Alberoni, "Sexo e amor".

Talvez a vida actual seja complicada e fonte de muito sofrimento. Contudo emergem novas possibilidades, novas formas de ser mais ricas e abertas. Como em todos os partos, há fases dolorosas mas também novas vidas mais plenas e livres emergem.

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"Francesco Alberoni tem um novo livro editado em Portugal. Chamou-lhe "Sexo e Amor". A obra, que surge quase 30 anos após a publicação de "Enamoramento e amor", foi escrita como "uma consequência natural" dos estudos que sobre a matéria dos relacionamentos humanos Alberoni tem vindo a produzir.

"Sexo e Amor" marca um novo ponto de viragem , dando, pela primeira vez, uma ordem e um sentido à trama de aspectos divergentes e convergentes que relacionam o amor e o sexo.

"Pensei que valeria a pena estudar as várias sociedades, as várias combinações entre sexo e sociedade. Fiz vários retratos, a partir de centenas de entrevistas, e com eles tentei transmitir aquilo que os homens e as mulheres de hoje sentem, desejam, querem, repudiam".

Para Francesco Alberoni, "é muito difícil, senão impossível", que uma relação baseada só em sexo possa durar. "Na sociedade actual, em que o acesso à Internet está cada vez mais facilitado, o sexo ficou, por isso mesmo, mais vulgarizado", conclui. Alberoni também adianta que "é muito frequente que sejam as raparigas a terem mais cedo relações sexuais do que os rapazes. E isto acaba por lhes trazer grandes desilusões, porque afinal a um desejo muito intenso não corresponde uma grande satisfação sexual. O amor está em permanente conflito com o sexo. Ao contrário do que acontecia há um século, nos dias de hoje há cada vez mais uma tendência para chegar ao amor através do sexo. A pornografia, que a Internet tornou mais acessível aos mais jovens, favorece muito a sexualidade promíscua e a bissexualidade. Tudo isto funciona como um obstáculo ao que chamo o enamoramento. Porque este passa necessariamente por diversas fases. Passa pelo fascínio, pela interpretação, pelas provas de reciprocidade. Por isso é que cada vez mais difícil formar-se um casal. Transformar o enamoramento em amor é muito complicado. Há formas de paixão que têm todas as características de enamoramento mas que, no fim de contas, têm também mecanismos de autodestruição".

Para Francesco Alberoni, "o amor hoje em dia só acontece se houver uma extraordinária intimidade física e espiritual. Quem ama e não é amado sofre muito". O autor de "Sexo e Amor" defende também a ideia de que há de facto diferenças entre a sexualidade feminina e masculina. "Este é, aliás, o único domínio em que há diferenças. As mulheres são mais sensíveis aos odores, ao tacto. Uma mulher apaixonada pode ter um orgasmo só pelo facto de tocar um dedo da mão do homem que ama. No homem, pelo contrário, todas as sensações estão mais concentradas no pénis " .

Na obra agora editada pela Bertrand, Francesco Alberoni recorre a uma combinação de histórias verídicas e relatos na primeira pessoa, colhidos de entrevistas ou de obras literárias. A partir desta estrutura narrativa o sociólogo analisa as diferentes experiências amorosas subsequentes de cada uma das formas que o amor e o sexo podem tomar. O livro é um sucesso editorial em Itália onde em três meses vendeu mais de 30 mil exemplares".

Ana Vitória in JN de 15-11-2006